O fim da caminhada de Campinas a São Paulo representa o fortalecimento da luta feminista e contribui para a integração dos movimentos sociais no país, tendo a solidariedade mundial como um dos valores.
Após onze dias de caminhada desde Campinas, de onde saíram no dia 8 de março, as duas mil militantes da Marcha Mundial das Mulheres chegam nesta quinta-feira (dia 18) a São Paulo, destino final da 3ª Ação Internacional do movimento. Ao todo, três mil mulheres dos 27 estados brasileiros participaram da chamada Ação 2010, que tem quatro eixos de luta: autonomia econômica das mulheres, paz e desmilitarização, pelo fim da violência sexista e pela defesa dos bens comuns e serviços públicos.
As militantes andaram, no total, 116 quilômetros, incluindo as entradas nas cidades de Valinhos, Vinhedo, Louveira, Jundiaí, Várzea Paulista, Cajamar e Osasco, além dos distritos de Jordanésia e Perus. Elas caminhavam pela manhã e, à tarde, realizavam atividades de formação. A de ontem, em Osasco, foi um debate sobre a integração dos povos e o papel do Estado.
“Lutamos pelo aumento do salário mínimo, pela construção de creches públicas de qualidade, pela legalização do aborto. São demandas que se chocam com os valores da sociedade patriarcal, racista e capitalista na qual vivemos. Por isso nossa batalha é árdua, é transformadora, já que o neoliberalismo na década de 1990 conquistou corações e mentes”, analisou Vera Soares, militante da Marcha e do campo da economia solidária.
A luta contra a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e contra a Organização Mundial do Comércio (OMC) uniu diversos movimentos sociais na resistência ao neoliberalismo. “As mulheres souberam aproveitar bem esse momento para se fortalecerem. A partir daí, ganhou visibilidade o projeto de integração dos povos latino-americanos”, relatou Nalu Farias, da coordenação da Marcha e da Sempreviva Organização Feminista (SOF). Ela lembrou também que na América Latina nasceram conceitos que atualmente reanimam a luta socialista mundial, como soberania alimentar (gestado pelo movimento camponês) e bem viver (fruto dos movimentos sociais da Bolívia e do Equador). “Tivemos a eleição de presidentes de esquerda em vários países da América Latina. Foi um sinal de que as pessoas queriam dar um basta ao neoliberalismo. Representou um avanço, mas também um desafio: obrigou-nos a criar espaços de diálogo com os governos”, avaliou Nalu.
O risco da cooptação dos movimentos sociais e do aparelhamento do Estado foi lembrado respectivamente por Ângela Silva, do movimento de moradia de São José dos Campos (SP), e por Terezinha Vicente Ferreira, da Articulação Mulher e Mídia, ambas militantes da Marcha. “Um exemplo de solidariedade regional foi o Brasil não ter reconhecido o governo golpista de Honduras. Mas eu me pergunto, caso o golpe tivesse sido aqui, se teríamos persistido na resistência a ele, como fez o povo de Honduras. Receio que não, porque a esquerda do Brasil está esfacelada e bastante desacreditada”, lamentou Ângela. “O Estado, tal qual o conhecemos, historicamente foi construído pela imposição. E a disputa para ocupar seus espaços e cargos tem dividido os movimentos sociais brasileiros”, argumentou Terezinha.
Tatiana Berringer, da Assembléia Popular, destacou a importância de fazer frente a este esfacelamento da esquerda e acumular poder popular, a fim de transformar a sociedade. “Acredito que a Marcha Mundial das Mulheres seja um exemplo deste acúmulo”, comemorou a militante. Elaine, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra na Bahia (MST-BA), concordou com a avaliação: “Nós do MST sabemos bem, na pele, como dói dificuldade de integração com a sociedade. A Marcha Mundial das Mulheres cumpre um pouco esse papel de integração dos movimentos”.
Seguiremos em marcha
O lema da 3ª Ação Internacional da Marcha Mundial das Mulheres é “Seguiremos em marcha, até que todas sejamos livres”. Por isso, nem no Brasil, nem nos outros 51 países que realizaram atividades no primeiro período de lutas (de 8 a 18 de março), esta quinta-feira significa um ponto final. No ato público em São Paulo, marcado para às 16h na Praça Charles Miller (ao lado do estádio do Pacaembu), estarão presentes, por exemplo, as bonecas Caminhantes, construídas pelas militantes que participam da Ação 2010. Elas representarão o país no segundo período de lutas, de 7 a 17 de outubro, na República Democrática do Congo.
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