O debate sobre a legalização e descriminalização do aborto agitou as duas mil militantes da Marcha Mundial das Mulheres. Nesta terça-feira, elas receberão em Perus a médica cubana Aleida Guevara.
A legalização e descriminalização do aborto foram as bandeiras de luta da Marcha Mundial das Mulheres destacadas nesta segunda-feira (15). Em Jordanésia, distrito de Cajamar, as duas mil militantes que estão caminhando de Campinas a São Paulo debateram das 18h às 21h o tema “Maternidade como opção, não como destino”.A atividade de formação começou com uma dinâmica apelidada de cochicho. Em grupos, as mulheres conversaram durante 20 minutos a partir de três perguntas provocadoras: Como elas vivem a maternidade (e/ou a possibilidade de engravidar)? Como encaram o aborto? Como têm acesso a métodos de prevenção da gravidez? A seguir, as primeiras dez inscritas sintetizaram para a plenária a discussão do grupo no qual estavam. Os primeiros relatos foram bem duros. “Aborto é crime. Sou totalmente contra”, sentenciou a militante Luciene, de Monte Alegre (MG). Diva, de Teresina (PI) mostrou-se um pouco mais flexível: “Sou a favor nos casos previstos em lei: quando a mulher foi estuprada ou corre risco de vida”. “Cadê o homem que engravidou? Por que o crime é da mulher que abortou?”, cantaram várias militantes presentes no debate, a este momento bastante acalorado. “A gente sabe que tem muita gente que se diz contra já abortou, mas não admite. Tem clínica clandestina de primeiro mundo na Raposo Tavares [rodovia paulista], atrás de uma borracharia, custa R$ 6 mil reais para interromper a gravidez”, declarou Vanda, militante da Marcha em São Paulo. “Quem tem dinheiro, faz aborto com segurança. Quem não tem, corre risco de vida”, concordou a amazonense Maiara. “A Marcha Mundial das Mulheres é provocativa, nos faz discutir um tema tabu na sociedade, indo além da posição do favorável ou contrária. O aborto é uma questão de saúde pública”, opinou a militante Izalene, que já foi prefeita de Campinas (SP). “Diante de uma gravidez, para qualquer opção (aborto ou maternidade), deve haver políticas públicas que garantam os direitos das mulheres a uma vida digna”, ponderou a mineira Ana Paula. Após as dez falas iniciais da plenária, houve uma rápida exposição de três palestrantes: Tatau Godinho, da diretoria da SempreViva Organização Feminista (SOF), Ana Carolina Pieretti, médica ginecologista e militante da Consulta Popular, e Fabíola Paulino, diretora de mulheres da União Nacional dos Estudantes. Tatau abriu essas falas mais gerais esclarecendo que a Marcha Mundial das Mulheres não propõe que o aborto seja um método anticoncepcional. Ela também desmistificou a idéia de que são as mulheres jovens, desinformadas e irresponsáveis que praticam aborto. “Como o aborto é criminalizado, há poucos dados sobre sua prática. Mas até onde a gente saiba, a maioria das mulheres que abortam são casadas e já têm filhos”, contou a diretora da SOF.“Ter filho é a única decisão da nossa vida da qual a gente não pode voltar atrás. Então a maternidade é algo sério, que não pode ser tratado de forma automática”, alertou Tatau. “Quando dizemos que consideramos o aborto um crime, precisamos parar e refletir o que isso significa. Queremos que as mulheres que abortaram sejam julgadas, condenadas e presas? E por que só elas e não os homens que as engravidaram?”, provocou a militante da SOF.A médica ginecologista Ana Carolina trabalha em um posto do Programa de Saúde da Família (PSF) na comunidade de Pium, no interior do Rio Grande do Norte. “O posto onde atuo cobre uma área de 2 mil moradores, mas eu só recebo uma pílula do dia seguinte por mês. Também não tenho injeções de hormônio nem pílulas anticoncepcionais suficientes para todas as interessadas que me procuram. E lá muitas mulheres só conseguem que o homem use preservativo, no máximo, em relações extraconjugais”, revelou Carol, como é conhecida. Descriminalizar o aborto e oferecer métodos seguros de se interromper a gravidez na rede pública de saúde evitaria a morte de milhares de brasileiras, todos os anos. De acordo com Carol, entre 1986 e 1991, quando o remédio Citotec (para úlcera) foi vendido livremente nas farmácias do Brasil, suas vendas triplicaram e o número de mulheres que adoeceram e decorreram em função do aborto caiu. Quando a venda do Citotec foi proibida, em função de seu uso como abortivo, as mortes resultantes do aborto aumentaram em cerca de 50%. Carol também explicitou o preconceito de gênero presente nesta discussão: “Os homens jovens vivenciam 2,5 vezes mais a experiência do aborto, em média, em suas vidas, do que as mulheres. Mas a indústria farmacêutica, para eles, faz o Viagra. E para as mulheres, anticoncepcional”. A fala de Fabíola, da UNE, foi na mesma direção: “Falar de maternidade é falar de sexualidade. A mulher jovem tem direito de viver livremente sua sexualidade, sem repressão”.
Maternidade deve ser opção, não destino imposto
Hoje (dia 16), a Marcha Mundial das Mulheres chegou ao Km 26 da rodovia Anhanguera, no Centro Santa Fé, em Perus, onde à tarde haverá um debate sobre paz e desmilitarização. A atividade contará com a presença ilustre da médica cubana Aleida Guevara, filha do revolucionário Che Guevara. A caminhada de Jordanésia a Perus durou pouco mais de quatro horas, das 6h10 às 10h25. Este foi o tempo no qual as duas mil militantes percorreram os 14,6 quilômetros que separam o Boiódromo, o alojamento anterior, do Centro Santa Fé, local do próximo pernoite. Quem puxou a Marcha nesta terça-feira foram as delegações da Paraíba, Goiás e Mato Grosso do Sul. Amanhã, as caminhantes andarão mais 13 quilômetros até Osasco, última parada antes do destino final, em São Paulo.
Fonte: www.sof.org.br/acao2010
Assista o video, onde as militantes da MMM cantam uma musica que fizeram sobre o tema: http://www.youtube.com/watch?v=_LV0qyvy9aY
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