Analine Specht
Cláudia Prates
Sirlanda Selau
O número de denúncias de estupro no Brasil, somente em 2012, foi maior que o de homicídios dolosos contra as mulheres, registrados no mesmo período, segundo dados da 7ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
De acordo com a pesquisa, o país registrou 50.617 casos de estupro em 2012, o que equivale a 26,1 estupros por grupo de 100 mil habitantes – o aumento é de 18,17% em relação a 2011, quando a taxa foi de 22,1 por grupo de 100 mil. O número de homicídios dolosos registrados em 2012 foi de 47.136.
Tocante ao Rio Grande do Sul, as ocorrências relacionadas ao crime de estupro, os quais compreendem as tentativas e os consumados, dão conta dos maiores índices registrados em todo o país, correspondendo a 43,5 em relação a cada grupo de 100 mil habitantes. Contudo, e como sabemos, o estupro é somente uma das formas de violação das mulheres.
Recente estudo publicado pelo IPEA, mostra que o Brasil registrou 16,9 mil feminicídios, entre 2009 e 2011, especialmente ensejados por casos de agressão perpetrada por parceiros íntimos. Tais números equivalem a uma taxa de 5,8 casos para cada grupo de 100 mil mulheres.
O estudo, também aponta que embora tenham sido registrados declínios nas taxas de violência e feminicídio em 2007, em período imediato à vigência da Lei Maria da Penha, no período subsequente os índices retomaram aos antigos patamares, mantendo-se estáveis a partir de então.
Estes dados mostram que mesmo com os avanços no campo das políticas públicas com a Lei Maria da Penha, o patriarcado ainda fortemente arraigado na sociedade, representa um grande limite à transformação das relações de hierarquia e opressão dos homens sobre as mulheres.
Compreender o fenômeno da violência sexista e suas bases materiais nos induz a constatação de que a violência doméstica, o estupro, o assédio sexual, o feminícidio, a mercantilização da imagem da mulher e o domínio e controle sobre seus corpos, fazem parte de uma mesma lógica em que se articula: patriarcado, machismo e capitalismo.
Os processos de desigualdades que decorrem desta tríade constituem a base material para todas as formas de violência contra a mulher. Ou dizendo de melhor maneira: a face mais cruel dessas desigualdades se expressa na violência sexista.
Este entendimento é fundamental para que se possa enfrentar a condição de permanente insegurança e opressão a que as mulheres estão expostas. Assim, é possível por um lado combater a impunidade, e por outro, romper com os círculos de violências, os quais se perpetuam, especialmente pela culpabilização da vítima e naturalização de uma cultura vocacionada à violação das mulheres.
Em razão dessas questões, o enfrentamento às diferentes formas de violência, também exige estratégias, as quais devem associar a força da militância feminista aos avanços institucionais, ainda que tímidos, os quais dizem respeito ao reconhecimento da violência sexista como categoria jurídica.
Nossos tempos passam a exigir atuações mais atentas aos anunciados e possíveis retrocessos. Isso porque, se de alguma forma o Brasil avançou no reconhecimento da violência, especialmente doméstica e familiar, há que se constatar a forte tendência conservadora, que impulsiona o recrudescimento do controle sobre o corpo e a vida das mulheres. É nesse contexto em que se insere o Estatuto do Nascituro, por exemplo, uma tentativa de institucionalizar a criminalização das mulheres e o domínio de seus corpos.
A autonomia do corpo e da vida das mulheres requer a garantia dos direitos e a segurança jurídica asseguradas pelo Estado laico.
Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres.
Analine Specht – Socióloga, militante feminista da Marcha Mundial das Mulheres
Cláudia Prates – Militante feminista da Marcha Mundial das Mulheres
Sirlanda Selau – Advogada e militante feminista da marcha Mundial das Mulheres
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