domingo, 23 de março de 2014

A Lei Maria da Penha e o Direito da Mulher a Viver sem Violência




APRESENTAÇÃO

Dando continuidade à nossa campanha de março, que trata sobre temas relacionados aos direitos das mulheres, apresentamos hoje algumas considerações sobre o chamado Estatuto do Nascituro.
Reforçamos o compromisso do nosso corpo jurídico na disputa pela reinterpretação e mesmo alteração dos dispositivos legais que não reconhecem a emancipação jurídica, política e social das mulheres.

Boa leitura!

A Lei Maria da Penha e o Direito da Mulher a Viver sem Violência 

A violência doméstica e familiar é um tipo específico de violência contra a mulher, que apenas recentemente foi reconhecida e tipificada na legislação brasileira, por meio da Lei 11.340/2006 – a Lei Maria da Penha.
Fruto da mobilização das mulheres e da tragédia pessoal da maioria da população feminina do país, a Lei Maria da Penha trouxe para o âmbito do interesse público uma problemática que até então pertencia, exclusivamente, às relações privadas.
Trata-se, portanto, de uma violência específica que se insere no conceito da violência sexista, fundadas nas desigualdades que decorrem das relações de poder havidas entre homens e mulheres. Relações estas que são hierarquizadas, socialmente construídas, tendo o patriarcado um sistema de naturalização e perpetuação dessas desigualdades.
Deste modo, o fenômeno da violência doméstica deixa de ser visto como parte do destino das mulheres para ser compreendido como um óbice à realização dos direitos fundamentais que a elas cabem. Assim, a Lei Maria da Penha se constitui como um instrumento importantíssimo na estratégia de enfrentamento das violências que afetam pelo menos 04 mulheres a cada 02 minutos em nosso país.
A aplicação da Lei Maria da Penha, nesses últimos oito anos, dá conta de confirmar que as manifestações de violência ocorrem especialmente pelos maridos, companheiros, namorados e afins. Do mesmo modo, reforça que se trata de um ciclo em que se agrava a forma de violência impetrada, culminando em muitos casos com o assassinato da mulher.
Somente no Rio Grande do Sul, em 41%7% dos casos de femicídio já haviam registros de agressão anterior, o que demonstra que se trata de um processo perverso de violências continuadas, anunciando parte expressiva dos assassinatos cometidos contra as mulheres. Os dados da Secretaria de Segurança do Estado informam também que em 75,9% dos eventos de violência o agressor é o marido, companheiro ou ex-companheiro; e que em 83,48% dos registros o femicídio ocorre na própria residência da mulher.
 Diante a complexidade da violência contra a mulher, a Lei Maria da Penha alberga aquelas violências (físicas, psíquicas e materiais) de caráter afetivo ou familiar suportadas por mulheres no ambiente doméstico, compreendido não somente pela coabitação.
Por outro lado, institui um conjunto de medidas protetivas que ora obrigam agressor, ora obrigam a vítima, visando intervir diretamente na situação de violência. Dessa forma, a natureza das medidas protetivas possibilita um procedimento célere e tempestivo, de forma a estancar aquela manifestação de violência.
Percebe-se, que a Lei Maria da Penha inova o ordenamento jurídico, tipificando a violência doméstica e familiar, como forma de responder a um largo período de impunidade e omissão do Estado brasileiro frente a essa realidade. Todavia, há muito que se avançar, seja na interpretação, seja na efetiva aplicação da Lei.
Ademais, restam outros desafios ao direito no tema da violência sexista, viabilizando um tratamento adequado em outras formas que ela se manifesta. Desafiam o direito o tema da exploração do corpo das mulheres; o tráfico de mulheres; a invisibilidade do trabalho reprodutivo realizado no espaço doméstico,, da associação da imagem da mulher ao consumo; no controle sobre o corpo e a sexualidade das mulheres; a criminalização das mulheres que atuam nos movimentos sociais, entre outros.


Todos esses temas se articulam e ensejam diferentes formas de submeter, reproduzir e perpetuar uma condição de violação às mulheres. A superação da violência como parte da história da mulher, exige enfrentá-los, na perspectiva de construir uma cultura de não violência, a partir da desconstrução das desigualdades entre homens e mulheres. Essa tarefa é de todos(as) e o direito deve ser um instrumento a serviço disso.

Sirlanda Selau e Christine Rondon
Militantes feministas
http://www.costaadvogados.adv.br/

Nenhum comentário:

Postar um comentário