“Não em nosso nome”. É isto o que nós, feministas da Marcha Mundial das Mulheres, dizemos à futura ministra da Mulher, da Família e dos Diretos Humanos.
O Ministério da Mulher, a Secretaria de Políticas para as Mulheres e outros organismos de políticas para mulheres são parte de uma conquista do movimento feminista que vem de longos anos. A primeira Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres foi criada no primeiro ano do governo de Lula (PT), em 2003.
O debate feminista parte da compreensão de que o Estado não é neutro em relação às desigualdades que sofrem as mulheres e a população negra. Entendemos que essas desigualdades são estruturantes do conjunto das relações sociais. Isso exige, portanto, mudanças econômicas, políticas e sociais. O Estado é conivente, reforçando a violência e a discriminação, ao recusar sua responsabilidade de criar políticas para reverter essa situação.
Desde 2003 até o golpe contra a presidenta Dilma ocorrido em 2015, a Secretaria de Políticas para as Mulheres ou Ministério da Mulher perseguia o objetivo de alterar as desigualdades vividas pelas mulheres na sociedade, através de políticas para o enfrentamento à violência, de articulação de políticas para as mulheres rurais elaboradas em conjunto ao também extinto Ministério do Desenvolvimento Agrário, políticas de criação de creche junto à pasta de Educação etc. Outra importante tarefa foi incentivar, através de apoio e recursos, que Estados e Municípios organizassem organismos de políticas para as mulheres, visando a implementação de políticas públicas locais. Com o golpe, estas políticas foram, em sua maioria, desmontadas.
O novo governo de Bolsonaro, antes mesmo de eleito, incitou a campanha #EleNão, que mobilizou manifestações massivas, organizadas em todo o território nacional pelo movimento de mulheres. Estas manifestações foram uma resposta à misoginia, ao racismo e à política econômica apresentada por ele na campanha. Mas não foi só isso. Bolsonaro, Eduardo Cunha , Magno Malta e outros dessa turma são velhos inimigos, que o movimento de mulheres há anos vem denunciando.
A proposta de nomear Damares Alves para estar à frente do Ministério da Mulher, da Família e Direitos Humanos casa direitinho com as proposta de Bolsonaro. Já era de se esperar, mas reafirmamos: este ministério não tem nada tem a ver com as necessidades das mulheres trabalhadoras do país, nem das famílias, que hoje são muito diversas, incluindo as famílias LGBTs e aquelas formadas apenas por mãe e avó, por exemplo, que não seguem o modelo nuclear. Além disso, sabemos que é impossível que este ministério responda às necessidades de luta por diretos humanos. Se Bolsonaro é a favor da tortura, do assassinato e da censura, como seu governo poderia respeitar os direitos humanos?
A primeira proposta de Damares é aprovar o Estatuto do Nascituro (PL 497/2007). Faz mais de dez anos que esses setores conservadores tentam aprovar tal projeto, que só não foi aprovado por conta da luta e resistência do movimento feminista. Este Projeto de Lei pretende considerar o óvulo fecundado como se fosse um sujeito pleno de direito. Isso significa que o organismo concebido e não nascido passaria a ter mais direitos do que a mulher.
O projeto pretende ainda legalizar a violência sexual que as mulheres sofrem, como o estupro, constrangendo as mulheres a não fazer o aborto consequente desta violação e instituindo o pagamento de auxílio para sustentação do nascido até os 18 anos. O projeto institui a chamada “Bolsa Estupro”, como é conhecida pelos movimentos de mulheres, reforçando que a punição recairá sobre a própria mulher violentada. A bolsa deverá ser paga pelo agressor e, caso não o faça, o ônus recairá sobre o Estado.
O estupro é um crime hediondo. Através deste projeto, o estuprador passa a ser chamado de genitor, e a vítima é obrigada a se relacionar com o criminoso, já que ele deverá assumir a paternidade. A hipocrisia, o abrandamento, a naturalização do crime do estupro e a violação de vários direitos das mulheres serão ainda mais fortes. Caso aprovado esse projeto, fica proibida ainda qualquer manifestação que trate do assunto do aborto, cerceando nosso direito ao debate, requisito fundamental da democracia.
A retomada do “Estatuto do Nascituro” é uma ameaça aos direitos das mulheres. Nele, estão reunidas as pautas mais retrógradas e de submissão, ostentadas pelo patriarcado e pelas instituições que o perpetuam ao longo dos séculos, praticando o controle sobre o corpo das mulheres, a institucionalização da violência sexual e o domínio sobre o destino e a vida das mulheres.
A Marcha Mundial de Mulheres repudia a posição desqualificada e medíocre da Ministra Damares e afirma: não em nosso nome! Damares não está ao lado das mulheres, e sim dos poderosos conservadores.
A nossa luta é todo dia! Por igualdade, autonomia e uma vida livre de fascismo, racismo, machismo e LGBTfobia!
Marcha Mundial das Mulheres
13 de dezembro de 2018
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