Os ataques aos
diretos básicos e duramente conquistados da classe trabalhadora do Brasil por
uma “onda” política reacionária e conservadora, que ascendeu através do golpe
de estado em 2016, já estão sendo sentidos no cotidiano da esmagadora maioria
dos e das brasileiras, e deve vir mais por aí. Esta “onda” é essencialmente
machista e alicerçada na ordem patriarcal, pois é promovida por homens brancos
e serão as mulheres as mais atingidas e prejudicadas. Neste texto apresentarei
o porquê disto aprofundando o pensamento sobre um dos setores da nossa
sociedade no qual é direito fundamental e uma atividade essencial à produção da
vida digna e saudável: o saneamento básico.
O saneamento básico é
um conjunto de atividades, infraestrutura e serviços que cuidam do
abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, gestão de resíduos (lixo),
limpeza urbana e gestão das águas pluviais (chuva). É reconhecido e estabelecido
como um direito básico e fundamental para todas pessoas, pois ninguém cresce e
se desenvolve com saúde e felicidade sem água potável, em um meio insalubre, sujo,
fedorento e com alto potencial de transmitir diversas doenças. O saneamento
básico é o cuidado com os meios em que vivemos e com a natureza, e está
profundamente ligado com a qualidade das águas do planeta.
No final do ano de
2018, a MP 868 foi aprovada sem nenhum diálogo com o setor do saneamento e da
saúde pública, pelo ilegítimo presidente Temer que assumiu de maneira
antidemocrática e perversa. Esta medida provisória altera a legislação do
setor, modificando nossa Política Nacional de Saneamento Básico de 2007 que foi
criada e aprovada como um compromisso com a sociedade brasileira em valorizar o
bem-estar e a saúde a partir do desenvolvimento do saneamento básico. Esta
medida abre espaço para o setor privado, no momento que alterou o artigo que
diz que os municípios e as empresas
estaduais públicas de saneamento podem fechar contrato sem precisar passar por
todo um processo burocrático e competitivo licitatório. Agora, com esta
alteração, as empresas públicas devem entrar em um processo de competitividade
junto a empresas privadas, perdendo nossa garantia de prestação de serviço por
entidade pública que visa a universalidade e não o lucro individual de seus
proprietários. Outro impacto significativo será a perda do subsídio cruzado, uma maneira que as empresas públicas encontravam
para subsidiar os investimentos nas pequenas cidades e regiões mais periféricas
usando dos rendimentos das grandes cidades e regiões mais ricas. Com a mudança,
as empresas privadas vão disputar pelo o atendimento destas áreas mais
lucrativas e não vão subsidiar as menores e mais pobres. Hoje, a MP encontra-se
em discussão no congresso pois estamos em luta contra a implementação do texto
atual. Queremos que as mudanças e reformas sejam feitas de maneira democrática,
com diálogo com a população e principalmente com os mais atingidos como, por
exemplo, as mulheres.
As mulheres são as
mais atingidas e prejudicadas quando não acessam o saneamento básico, uma vez
que, desde que nascem, são ensinadas a dar conta de toda a responsabilidade dos
cuidados da família. Historicamente as mulheres se veem sobrecarregadas de
trabalhos domésticos no qual não é reconhecido e remunerado, além de muitas
vezes também estarem ocupando cargos de trabalhos ditos formais, tendo jornadas
triplas de trabalho. Onde não há saneamento básico, há doenças, e são as
mulheres as responsáveis por cuidar dos doentes. Também, são as mulheres
responsáveis pela seguridade da alimentação e, caso não haja água de qualidade,
isto torna-se uma tarefa arduamente difícil. Quando as comunidades e famílias
estão doentes, significa que mulheres estão doentes, porém mais sobrecarregadas
que os restantes de trabalho, preocupação e carentes de cuidados de si mesmas.
Este é apenas um
setor, dos muitos, que estão sendo pauta de discussão no congresso nacional que
ferem nossos direitos. A MP 868/2018 vem disfarçada de “medida necessária para
conquistar o acesso universal do saneamento básico já que o setor público não
tem recursos”. Há um grande lobby acontecendo, e não é de hoje, com o objetivo
de enfraquecer o setor público que fornece esses serviços, construindo uma
imagem de insuficiência e incapacidade perante a sociedade. Afinal, na lógica
do lucro, grande ideia mercantilizar este setor, não é mesmo? Pois, sendo a
água o bem mais essencial para se viver, absolutamente todas as pessoas
necessitam dela. Assim, dominam e decidem, mercantilizando o setor.
Consequentemente decidem por nós, pelo bom desenvolvimento da nossa vida ou
não, decidem as áreas prioritárias para avançar os serviços, decidem quem
merece ou não merece acessá-lo. E, por óbvio, as áreas escolhidas são as quais
podem gerar mais lucros e manter os privilégios aos privilegiados. É por isso
que este serviço deve ser público, no qual a prioridade seja a universalidade e
que os rendimentos sejam investidos em mais expansão de qualidade de vida há
quem ainda não têm.
Por isso resistimos
para viver e marchamos para transformar esta realidade. Estamos juntas aos
movimentos sociais que lutam pela defesa do meio ambiente saudável e dos bens
comuns, e somos contra a mercantilização da água assim como o patriarcado faz
com os nossos corpos. Lutamos pelo acesso ao saneamento básico àqueles
territórios que atualmente são precarizados, pois só assim é possível
transcender a situação de pobreza, doença e violência. Transformar esta
realidade é transformar a vida das mulheres.
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