Porto Alegre
À primeira vista, pode parecer contraditório defender a vida nas ruas, em uma pandemia que já matou mais de 450 mil pessoas no Brasil. Mas não é. Parte considerável dessas mortes poderia ter sido evitada com uma ação de Estado que colocasse a vida acima do lucro, da ganância, do negacionismo e de valores que dizem que algumas vidas valem menos que as outras. É pouco dizer que o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (sem partido), não fez nada para conter a disseminação da covid-19. Mais que isso, ele agiu para que a doença se espalhasse pelo país, matando centenas de milhares de pessoas.
É por isso que, no dia 29 de maio, brasileiras e brasileiros se levantaram, em uma onda de manifestações, exigindo “Fora Bolsonaro”, vacina para toda população e a manutenção do auxílio emergencial. O presidente e seu governo, além de terem impulsionado a disseminação do novo coronavírus no Brasil, precarizam cada vez mais a vida das mulheres e do povo negro e trabalhador, que sofrem com a fome, o desemprego, o descaso e a destruição de perspectivas de futuro.
Apesar do silêncio da mídia hegemônica nacional no fim de semana, os atos contra o governo tomaram as ruas em mais de 200 cidades brasileiras, nos 26 estados e no Distrito Federal, além de manifestações em pelo menos outros 14 países no mundo. A presença feminista da Marcha Mundial das Mulheres nas capitais e interiores do país foi registrada e publicada nas redes sociais do movimento, uma prática coletiva da comunicação feminista e popular.
O Brasil estampado nos cartazes, faixas, cantos e gritos de quem foi às ruas evidencia um país bem diferente daquele estampado na capa dos jornais no dia seguinte da manifestação. Mais uma vez, a imprensa nacional, ao ser pressionada a fazer “uma escolha muito difícil”, repetiu sua permanente opção pela narrativa das elites econômicas e políticas, que defendem que vivemos em um país que caminha rumo à superação da pandemia e da crise agravada pelo vírus, na contramão das condições concretas vivenciadas pela maior parte da população.
Durante a mobilização em São Paulo, a militante Sarah de Roure expressou as reivindicações feministas da Marcha Mundial das Mulheres diante desta conjuntura política. “Somos os mesmos que, na Colômbia, são chamados de loucos, estando em greve há mais de um mês. Somos as mesmas que no Chile ocupamos as ruas e o parlamento. Somos as mesmas que legalizamos o direito ao aborto na Argentina. Nós, que fomos chamadas de loucas, falamos que loucos são eles, genocidas! Porque se somos loucos os que sonhamos, sim, somos loucos todos nós: os que sonhamos em refundar o Brasil, os que sabemos que estamos em um processo de disputa política cotidiano que vai nos levar à vitória”, declarou.
Fomos às ruas cuidando umas das outras. A participação das mulheres nos atos contou com um esforço anterior para sairmos em segurança, garantindo que todas tivessem e usassem máscaras seguras. Antes das manifestações, fizemos a publicação em imagem e em áudio de uma lista de cuidados. Ao contrário do governo genocida, que espalha a morte, nós vamos às ruas porque queremos viver!
Caxias do Sul
A Marcha levou batucadas, lambes, faixas e música – nossas vozes – para as ruas! Levou também a memória das mulheres trabalhadoras que tiveram que se expor aos riscos de contágio para sobreviver e não conseguiram resistir nos leitos lotados de UTI. Dentre elas, estão mulheres gestantes e puérperas que a covid-19 matou. No Brasil, gestantes morrem mais de covid-19 do que o resto da população. Foram 494 mortes maternas em 2021 e 457 em todo o ano de 2020.
No Recife, a Polícia Militar atacou a manifestação. Balas de borracha atingiram e cegaram um olho de dois trabalhadores que sequer participavam dos atos. A MMM de Pernambuco publicou um vídeo denunciando a repressão ao livre direito de manifestação e cobrando responsabilidade do governador: “Paulo Câmara, queremos saber quem deu a ordem para o Batalhão de Choque”. Veja mais aqui.
Contra a violência racista, que atinge de muitas maneiras a vida das mulheres no país, inclusive de forma militarizada, as companheiras de São Luís do Maranhão afirmaram: “a vida das mulheres negras importa!”.
Em Ubatuba, no litoral paulista, as mulheres chamaram a atenção para outro aspecto desse governo de morte: o patrocínio do ministro Ricardo Salles ao saqueio e destruição de terras, florestas, água e vida de mulheres dos povos tradicionais e indígenas. “Salles destrói a natureza, Bolsonaro ataca nossas vidas, e a resposta é uma só #ForaBolsonaro!”, declararam elas.
Em Palmas, no Tocantins, a MMM levou a batucada feminista às ruas contra o governo genocida de Jair Bolsonaro, em luta por vacina para toda a população e em defesa das universidades federais e da vida do povo brasileiro. A batucada também esteve presente e forte em Blumenau, Santa Catarina. Esses são apenas alguns exemplos da força do dia 29 de maio. Por todos os cantos teve ação popular, feminista e antirracista para defender a vida, com expressões diversas de acordo com a criatividade e organização de cada território.
O encerramento da fala de Sarah de Roure sintetiza a luta para derrotar a política de morte, pautada na rebeldia e na solidariedade, que são marcas do feminismo popular. Como ela disse no carro de som, “se eles cortam o auxílio, nós fazemos cozinha comunitária. Se eles aumentam o desemprego, nós organizamos redes de solidariedade. E assim nós estamos construindo a vitória do povo brasileiro contra o genocídio do Jair Bolsonaro. É assim que vamos construir o impeachment do Jair Bolsonaro. Olhe para o lado por um segundo: esse homem, essa mulher, negro, negra, lutador… Essa é a cara da derrota do Jair Bolsonaro. Nós vamos derrotar o fascismo no Brasil! Nas ruas, na organização das mulheres, do povo negro e do povo trabalhador. Fora Bolsonaro!”
Santana do Livramento
*Texto originalmente publicado em http://www.marchamundialdasmulheres.org.br/mulheres-foram-as-ruas-denunciar-o-governo-genocida-de-bolsonaro/ Confira fotos das manifestações pelo país no link.
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