quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Não, a culpa não é delas!


“A leitura – mãe e filha”, pintura de George Dunlop-Leslie.
por: Raquel Duarte*
Chama a atenção como nos espaços de discussão de gênero, frequentemente aparecem falas de responsabilização das mulheres pela reprodução do machismo. Falas do tipo “se o homem não ajuda em casa, a culpa é da mãe que não o educou para isso” ou “são as mulheres que criam os futuros machistas”, são muito comuns.
Está intrínseco no pensamento das próprias mulheres que se os meninos crescem machistas, a culpa é das mães, afinal, são elas as responsáveis pela educação das crianças.
É importantíssimo analisar dois elementos dessa afirmação. O primeiro refere-se à tarefa do cuidado, pois ao afirmarmos que as mães são as responsáveis por seus filhos se tornarem machistas, estamos reafirmando também a divisão sexual do trabalho que imputa a responsabilidade do cuidado e da educação unicamente às mulheres. É preciso desconstruir esse pensamento e afirmar cada vez mais, que a responsabilidade pelo cuidado e pela educação não é só das mães, mas também de toda a família e do Estado.
É responsabilidade do Estado uma vez que este deve garantir que todas as crianças tenham acesso à escola de educação infantil e aos demais níveis de ensino. Também é dever do Estado garantir que este ensino seja público e de qualidade, baseado numa educação inclusiva, não-sexista, não-homofóbica, não-lesbofóbica e anti-racista, livre de qualquer forma de preconceito.
Então, não podemos esquecer: a tarefa do cuidado e da educação deve ser compartilhada. Compartilhada entre as mães, os pais, a família, a sociedade e o Estado. O segundo elemento que deve ser analisado é referente ao próprio ato de culpar as mulheres. Ato este, aliás, que sempre carregamos nas costas. A culpa é da Eva, na mitologia bíblica sobre a criação do universo; a culpa são das bruxas, que não se adequavam aos ditames da sociedade; a culpa é dela que estava com uma roupa curta de demais; a culpa é dela que mereceu apanhar do marido; se ela aceita as que as coisas sejam assim, o problema é dela…
Nós, mulheres, não podemos aceitar essa culpabilização eterna. Não podemos reproduzir esse pensamento formado pela sociedade patriarcal. Sabemos que não é fácil despertar para toda a opressão que existe na nossa sociedade. E também não é simples para as mulheres se desprenderem das obrigações que historicamente lhe foram atribuídas. Nesse sentido, é preciso lembrar a conhecida frase da feminista Rosa Luxemburgo: “quem não se movimenta não sente as correntes que o prendem”.
É mais ou menos como o ciclo da violência: uma criança que foi violentada ou que conviveu toda a sua infância com a violência doméstica e familiar, tem grandes chances de reproduzir essa violência quando crescer. Mas esse ciclo pode ser rompido!
Da mesma forma acontece com as mulheres em relação ao machismo. Uma vez que elas despertam para opressão que sofrem, dificilmente continuarão a aceitá-la em suas vidas. Então vamos ajudar as mulheres a enxergarem o machismo e todas as formas de opressão que as cercam.
Não podemos apontar o dedo e dizer que a culpa é das mulheres. Não, a culpa não é delas! Vamos abraçá-las e dizer com toda nossa força: “Companheira me ajude que eu não posso andar só, eu sozinha ando bem, mas com você ando melhor!
*Raquel Pereira Duarte – advogada e militante da Marcha Mundial das Mulheres/RS

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