Olá marchantes,
Com
muita honra queremos publicar o artigo escrito pela nossa companheira
Juliana* da MMM RS sobre o racismo e a branquitude. A
importância desta abordagem é pelo reconhecimento histórico de que
racismo é sim coisa de gente branca, e que sim as pessoas brancas
precisam falar sobre os privilégios de ser branco numa
sociedade racista, machista, homofóbica. Não precisa ser negra para
falar sobre racismo. Importante falar a partir do lugar que fazemos parte, a partir do nosso lugar de fala. Somos
diferentes, mas com o respeito às diferenças podemos admitir nossas
responsabilidades na manutenção desta estrutura racista. Entender seu lugar de fala é entender seu lugar de privilégio e vice-versa.
Jean-Baptiste Debret retratava com bastante crítica a cara do Brasil Colônia. |
Escrevo este texto enquanto mulher branca que compreende
seu privilégio branco e por entender que é dever dos brancos se somar aos
negros na luta antirracista.
A colonização europeia, que antes de qualquer coisa trata-se
de sobreposição cultural visto que os europeus impuseram seus costumes aos
povos originários e aos africanos escravizados promovendo apagamento das
culturas próprias desses povos, trouxe consigo a tentativa de embranquecer a
população. O intuito do embranquecimento da população nativa era promover a
“harmonização” entre as raças e fundamentou a sociedade no estupro das mulheres
negras e indígenas. A lógica colonial de dominação racial formou a classe
dominante branca brasileira que tem como uma de suas características mais
marcantes o “querer ser europeu” enquanto fenótipo e enquanto cultura.
O Brasil de 2018 e a eleição de Bolsonaro levaram por
terra o mito da democracia racial. Apesar de o próprio anti-presidente proferir
frases como “não há racismo no Brasil”, não é de hoje que vemos cada vez mais
mortes de jovens negros por parte do aparato do Estado e o aprofundamento do
abismo racial que existe em nosso país.
Sabemos que o alvo da guerra às drogas é a população
negra e periférica e graças à militarização das favelas a polícia vem cumprindo
seu dever com muito êxito.
O assassinato encomendado de Marielle e Anderson em março
de 2018 e revelações posteriores tornaram evidente que quem busca poder nesse
país não está disposto a ser freado. Nem a representatividade de uma vereadora
negra, bissexual e favelada eleita com quase 50 mil votos – a quinta mais votada
da cidade do Rio de Janeiro. Outros casos? Jenifer, Kauan, Kauã, Kauê, Agatha e
Kethellen foram baleados e mortos na região metropolitana do Rio em 2019. Todos
eram crianças negras. Todos atingidos pela PM do Rio.
Com relação à pandemia os dados são
alarmantes. Em matéria publicada no dia 4 de maio, o jornal Estadão divulgou
que na cidade de São Paulo o risco de morte por Covid-19 é 62% maior para
negros que para brancos, sendo que especialistas apontam que condições
socioeconômicas, como saneamento básico precário, dificuldade de acesso à
assistência médica e dificuldade de acesso à alimentação adequada estão
vinculadas. No RS, um estudo do IBGE em 2012 mostrou que os brancos ganham 59%
a mais que os negros. Se em anos anteriores vivíamos a conciliação de classes e
o mito da democracia racial, em 2020 nos salta aos olhos o genocídio da população
negra como política de Estado, seja pelas mãos da PM, pela falta de políticas
para tratamento e assistência durante a pandemia do Covid-19 ou pela normalização
das desigualdades sociais.
E a branquitude?
“Falar de branquitude não é sobre
ensinar o branco sobre seu papel. É colocar em destaque os agentes responsáveis
pela criação e perpetuação do racismo”. Com essa frase, Obirin Odara nos mostra
que o racismo não é a história do povo preto. O racismo é a história do povo
branco e como ele explorou aqueles corpos que categorizou como “não seres”.
O sujeito branco, independente de sua escolha, usufrui
dos privilégios da branquitude. O corpo branco entende que ele pode tudo, pois
como não se racializa, não se coloca como coletivo e dessa forma se permite
agir como indivíduo. E justamente por não se racializar, o mundo branco está
ausente de violência racial. O branco pode sofrer a violência de gênero, de
classe, dentre outras, mas o famoso “racismo reverso” não passa de uma falácia.
Isso porque a branquitude é uma estrutura composta pelo Estado, pela mídia,
pelas leis e demais instituições que compõe a nossa sociedade e encontram-se em
uma confortável posição de poder desde a colonização até o presente momento.
A grande questão para nós brancos é como se tornar um
sujeito branco crítico sem diminuir a complexidade do racismo?
Sentir-se culpada não é o objetivo, embora seja inevitável,
pois a culpa imobiliza. Precisamos de ações que gerem reflexões individuais e
coletivas sobre a responsabilidade das pessoas brancas na estrutura da sociedade
que vivemos. Práticas que reflitam a busca pela nova sociedade que desejamos
construir e que só pode ser efetivamente inclusiva com a participação dos povos
pretos e originários na sua construção. Essa é a nossa tarefa enquanto
branquitude antirracista: colocarmo-nos ativamente como aprendizes na
reconstrução das relações raciais como sujeitos
e parceiros políticos dessa construção protagonizada pelo povo negro e
indígena.
Juliana, feminista militante da MMM RS, principiante nos estudos sobre branquitude e racismo
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outras contribuições para o debate deste tema:
Escutando
e estudando mais sobre o racismo chegamos no Manifesto Anti Racista
(abaixo), e muitas das questões e compromissos trazidos pelo manifesto foram
apresentados pela nossa companheira marchante Bruna Letícia dos Santos, em duas
oportunidade em que tivemos a satisfação de ouvi-la: atividade de
formação feminista de 14 de março e recentemente no Encontro Estadual da MMM RS em 27/06.
1) MANIFESTO ANTI RACISTA - Eu reconheço que vidas negras importam e me comprometo:
- A me educar sobre mais sobre a temática racial e o racismo estrutural no Brasil, inclusive lendo mais autoras e autores negros e parar de minimizar o que acontece aqui no Brasil, quando comparo com outros países como os Estados Unidos.
- A espalhar a necessidade de que outras pessoas, entre amigos, colegas de trabalho, familiares, se eduquem e que escolas coloquem em pauta a questão racial no Brasil em disciplinas ao longo do ano, desde o ensino básico.
- Como pessoa branca devo falar mais do racismo com e entre pessoas brancas, entendendo que o meu lugar de privilégio deve ser de aliado e ativamente usado para este fim
- Apoiar pessoas negras: escutando seus pontos de vista sem minimizá-los, comprando delas quando empreendedoras ou repostando suas ideias, por exemplo.
- Denunciar o racismo em suas diversas formas e manifestações de violência física, verbal e até as não ditas e apoiar ativamente movimentos de pessoas negras, entendendo que como pessoa branca, não tenho protagonismo desta luta, mas posso usar meu corpo e meu lugar de fala para abordar a temática
- Dissociar a trajetória de pessoas negras única e exclusivamente do racismo. Pessoas negras não discutem só sobre racismo. Pessoas negras já tem voz, apenas devem ter mais visibilidade para terem suas narrativas propagadas para além do racismo
- A me educar sobre mais sobre a temática racial e o racismo estrutural no Brasil, inclusive lendo mais autoras e autores negros e parar de minimizar o que acontece aqui no Brasil, quando comparo com outros países como os Estados Unidos.
- A espalhar a necessidade de que outras pessoas, entre amigos, colegas de trabalho, familiares, se eduquem e que escolas coloquem em pauta a questão racial no Brasil em disciplinas ao longo do ano, desde o ensino básico.
- Como pessoa branca devo falar mais do racismo com e entre pessoas brancas, entendendo que o meu lugar de privilégio deve ser de aliado e ativamente usado para este fim
- Apoiar pessoas negras: escutando seus pontos de vista sem minimizá-los, comprando delas quando empreendedoras ou repostando suas ideias, por exemplo.
- Denunciar o racismo em suas diversas formas e manifestações de violência física, verbal e até as não ditas e apoiar ativamente movimentos de pessoas negras, entendendo que como pessoa branca, não tenho protagonismo desta luta, mas posso usar meu corpo e meu lugar de fala para abordar a temática
- Dissociar a trajetória de pessoas negras única e exclusivamente do racismo. Pessoas negras não discutem só sobre racismo. Pessoas negras já tem voz, apenas devem ter mais visibilidade para terem suas narrativas propagadas para além do racismo
Vamos assinar? -Manifesto SEJA ANTI RACISTA - https://www.sejaantirracista. org/
2) QUAL O LUGAR DOS SUJEITOS BRANCOS NA LUTA ANTIRRACISTA EM UM CONTEXTO ULTRACONSERVADOR https://dialogosdosul.
5). Marxismo e a questão racial – Sílvio Almeida para Tv Boitempo, disponível em
(https://www.youtube.com/ watch?v=jedLb...)
6) Lélia Gonzales: racismo estrutural – Jaqueline Conceição para Casa do Saber,
disponível em (https://www.youtube.com/ watch?v=X2ruq...)
7) Razão e barbárie do racismo – Jaqueline Conceição para Casa do Saber,
disponível em (https://www.youtube.com/ watch?v=2sKP-...)
8) Liberalismo: escravidão, colonialismo, racismo... – Jones Manoel, disponível em (
https://www.youtube.com/watch? v=YrgiQ... )
9) White privilegie – Kylaj Lacey . Poema declamado em inglês com legenda, disponível
em (https://www.instagram.com/tv/ CBBqbL1A...)
10) Pactos narcísicos no racismo: branquitude e poder nas organizações
empresariais e no poder público" – Maria Aparecida da Silva Bento. Tese de
Doutorado, disponível em (https://teses.usp.br/teses/ disponivei...)
11) Diálogos contemporâneos sobre homens negros e masculinidades – Org.
Henrique Restier e Rolf Malungo de Souza
12) Livro Fragilidade Branca -
Robin DiAngelo - https://revistas.ufrj.br/ index.php/eco_pos/article/ view/22528
13)Grada Kilomba - Racismos da Plantação - https://www.academia.edu/ 39868012/MEM%C3%93RIAS_DA_ PLANTA%C3%87%C3%83O_-_EPIS%C3% 93DIOS_DE_RACISMO_COTIDIANO
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