Mudar a lei para envenenar a vida
Na última semana estamos acompanhando de perto o tema da audiência pública convocada pela Frente Parlamentar em Defesa da Alimentação Saudável juntamente com dezenas de entidades ambientalistas, movimentos sociais, setores de Universidades, Conselhos de controle social, entre outras organizações populares e sindicais. A audiência que acontecerá na segunda-feira dia 7 de dezembro, da continuidade ao debate e à tentativa de impedir que o governo do Estado modifique a legislação sobre agrotóxicos no Rio Grande do Sul (RS), em especial A LEI Nº 7.747, DE 22 DE DEZEMBRO DE 1982, que dispõe sobre o controle de agrotóxicos e outros biocidas a nível estadual.
Essa
Lei sempre foi motivo de orgulho de quem luta pela agroecologia, pela saúde e
por um ambiente seguro para reprodução da vida e do viver. Foi uma das primeiras legislações de controle
dos agrotóxicos no Brasil, sendo construída com ampla participação popular. No
início da década de 1980 já havia no RS, principalmente em Porto Alegre, muitos
ambientalistas denunciando a contaminação do Guaíba por diversos resíduos,
entre eles o veneno da produção agrícola. Esta legislação foi pioneira, é o que
podemos chamar de uma das “boas façanhas” dos legisladores do RS (no masculino
porque na época eram apenas “eles”). No debate sobre a lei, foi adotado como critério
geral a proibição do uso dos produtos que tivessem restrição de uso nos países de
origem. Como sabemos, vários produtos têm sido banidos pela União Europeia e no
Estados Unidos, sendo assim proibida a utilização destes em território
estadual.
No
dia 16 de novembro de 2020, o governador do estado encaminhou, em regime de
urgência, à Assembleia Legislativa o Projeto de Lei n° 260/2020 que altera a Lei
n° 7.747 de 22 de dezembro de 1982. O Projeto encaminhado pelo governador,
argumenta a necessidade de equacionar a legislação do RS às normas nacionais.
Todas devemos lembrar que o governo federal, cujo mandante não citarei o nome,
juntamente com a bancada ruralista trabalham de forma incansável para
consolidar os interesses do mercado de agrotóxicos no Brasil. A proposta do Governo
do Estado se resume a um único Parágrafo: §2º Só serão admitidas, em
território estadual, a distribuição e comercialização de produtos agrotóxicos e
biocidas, seus componentes e afins, já registrados no órgão federal competente
e que sejam cadastrados, respectivamente, nos órgãos estaduais competentes,
conforme regulamento”. Ou seja, o alinhamento com a política nacional de
agrotóxicos, que é considerada desastrosa, resulta em um retrocesso da lei
vigente, permitindo a comercialização de produtos cujo uso é proibido no país
de origem.
Sabemos que ocorre
frequentemente o contrabando de venenos. Basta fazer uma busca na rede e algo
assustador vai aparecer. A população em geral, inclusive que vive perto das
áreas mais afetas por pulverização aérea, não faz a menor ideia do risco que
corre. O gráfico abaixo foi retirado do site do MST. É uma informação do
próprio governo e nos mostra o volume de solicitações de registro para
fabricação e uso de agrotóxicos no Brasil. Nele podemos observar como tem
avançado a passos bem largos nos últimos anos.
Fonte: https://mst.org.br/2020/11/12/agro-e-toxico-somos-o-pais-que-mais-consome-agrotoxicos-no-planeta/
O MST é uma das melhores
fonte de materiais sobre esse tema e tem um trabalho de acompanhamento apoiado
por pessoas que estudam e pesquisam em diversas áreas. A mobilização da
população é fundamental nesse momento para motivar a tentativa de fazer com que
o Governo do Estado, que é o autor do projeto, retire o regime de urgência é
muito importante. Não custa lembrar que durante todo esse ano assistimos os
interesses do mercado governando o RS. A tentativa constante de flexibilização
da legislação ambiental para viabilizar os interesses das mineradoras. Com a
pandemia, a restrição de mobilização presencial e a Assembleia Legislativa
completamente cercada para reforma, assistimos mais um capítulo da triste
história do papel exercido pelos governos como meros gestores dos interesses do
mercado, nesse caso dos grandes fabricantes de veneno.
Nós mulheres feministas,
anticapitalistas, antirracistas da Marcha Mundial de Mulheres, estamos nesta
luta. Na luta por comida de verdade sem veneno e biodiversa. Na defesa dos bens
comuns, da água, da terra, da saúde dos povos, da agroecologia como forma de
viver produzir e reproduzir a vida, dos direitos dos povos originários.
Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA) desde
2008 o brasil é um dos países que mais consome agrotóxico. Fabio Franke,
Coordenador de alta complexidade em oncologia do Hospital de Caridade de Ijuí,
Cidade ao Noroeste do Estado, afirma que não há dívidas na relação do veneno
com a doença. Só na unidade atendida
pelo Dr. Franke são 3.600 mil novos caso por ano, ao todo já contabilizou 23
mil casos, 22 mil atendidos pelo SUS que desembolsa 12 milhões por ano de
dinheiro público para a tratamento (ver matéria completa em: http://www.saude.ufpr.br/portal/observatorio/noticias/alto-indice-de-agricultores-gauchos-com-cancer-poe-agrotoxicos-em-xeque). Na mesma
matéria, a Associação Brasileira de Saúde coletiva (ABRASSO) afirma que cada
brasileiro consome em média 12 litros de veneno por ano. A bióloga Werner
Ferreira, professora da Universidade UNIJUI diz que nessa região o consumo de
agrotóxico pode ser três vezes maior. Segundo o INCA, nos sintomas crônicos do
uso de agrotóxicos também incluem questões de saúde mental, de abortamento.
São as mulheres que cuidam das pessoas que adoecem na família. As mulheres também adoecem e morrem de câncer de mama e de útero, ficam muito cansadas e padecem com dor na alma. Precisamos falar das histórias das mulheres que gastam anos de suas vidas cuidando de familiares com câncer. O que sabemos das histórias das crianças assistem seus pais alagados pela dor durante toda a infância, cressem órfãos de afeto na escuridão da incerteza com a vida. Tudo isso promovido pela ganância do mercado que coloca o lucro acima da vida humana e da natureza.
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