quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

Nota de Solidariedade MMM RS

Foto: Rompimento de barragem da Vale em Brumadinho (MG) (Corpo de Bombeiros/Divulgação)
          
          A Marcha Mundial das Mulheres do RS vem por esta nota prestar total solidariedade aos atingidos pelo rompimento da barragem da Mina Feijão em Brumadinho-MG. Mais um crime cometido pela empresa Vale, assim como foi em 2015 no município de Mariana com o rompimento da barragem da Samarco, matando 19 pessoas e um rio. Já se passaram três anos e não houve justiça, os atingidos não foram indenizados ou assistidos como deveriam, e o Rio Doce, assim como diversos habitats do entorno, estão completamente degradados. O crime se repete neste ano de 2019, porém dessa vez com mais destruição e vidas perdidas. Até agora já são 99 mortos e mais de 270 desaparecidos (30/01/2019), comunidades destruídas e 12 mil m³ de rejeitos descendo rio abaixo podendo atingir em até 30 dias um dos maiores rios do país, o Rio São Francisco, impossibilitando o abastecimento de água e comprometendo a produção de energia para milhares de pessoas.

          Sabemos que a atividade de extração mineral é uma das bases da economia brasileira, sendo um dos países que mais importam matéria prima mineral. É uma atividade grandiosa de alto risco e potencial poluidor, que modifica grandes extensões de área, atingindo flora e fauna e toda natureza direta e indiretamente, além de consumir imensas quantidades de água para o beneficiamento do minério extraído. Sabemos também que a Vale é uma das empresas mais ricas do mundo pois seus lucros são exorbitantes a partir da supra exploração dos minérios e suas exportações. Anteriormente, quando a Vale era uma empresa estatal, os lucros tinham destinos estatais, como para políticas públicas, melhorias de infraestrutura para população, melhorias no setor da saúde e etc... Hoje, sendo uma empresa privada, vendida nos anos 90 pelo ex-presidente FHC, os destinos dos lucros também são privados, para empresários e outros profissionais da elite dominante do capital. Para que os lucros se mantenham altos, mesmo com as quedas dos valores das matérias primas no mercado internacional, é preciso “cortar gastos” e estes cortes são geralmente em áreas importantíssimas para garantir a segurança de todos perante esta atividade como, por exemplo, monitoramentos constantes, planos de prevenção, projetos mais onerosos, porém mais adequados, e ações e medidas corretivas. Tudo isso que foi citado demanda muito estudo e custa muito dinheiro e, em certos casos, valores a cima das multas impostas pelos poderes públicos. Os cortes de gastos nunca são diretamente nas rendas e salários dos milionários que lucram com a mineração, mas sim em investimentos que acabam por precarizar as condições de trabalho. O contrato de serviços terceirizados é uma maneira de a empresa diminuir os custos com funcionários e a Lei da Terceirização, aprovada em 2017, veio corroborar e institucionalizar esta precarização.

          Sentimos imensa dor por toda destruição causada, pelos assassinatos dos trabalhadores e das trabalhadoras, assim como pelos seus familiares que sofrem, e também por todos os habitats que foram destruídos com a enxurrada de lama tóxica. Frente o capital, nossas vidas não valem nada. Frente ao capital, não há sustentabilidade da vida. Também sentimos muito por todas as mulheres que terão que ser resistentes para garantir os cuidados da família, dos doentes e das crianças como alimentação e moradia, pois a ordem patriarcal joga toda essa responsabilidade para as mulheres que trabalham exaustivamente, sem garantia ou remuneração, pela invisibilidade do trabalho de cuidados essencial. O modelo capitalista exploratório da natureza e dos corpos, aprofunda as desigualdades e gera tristeza e morte. Seguiremos na luta por justiça, por uma sociedade feminista, livre de pobreza e desastres, pela sustentabilidade de toda a vida, compreendendo os recursos e os limites naturais e pela autonomia das mulheres com fim do patriarcado capitalista, pois somos nós que mais sofremos nas crises.

          Água, mulheres e energia não são mercadorias!

segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Estaremos nas ruas, somos resistência!


Vanessa Gil*
Cláudia Prates**

Um antigo debate da esquerda volta à tona já no início do governo fascista que se instalou no Brasil, as pautas identitárias como divisionistas e de menor importância na conjuntura geral.
Estamos diante de um governo que surpreende no conjunto da sua obra, e que reforça seu pensamento ao nomear a Pastora Damares Alves, uma Ministra que reverbera absurdos numa estrutura chamada de Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. Não faltaram memes que viralizaram mesmo antes da sua posse, ou depois de sua fala sobre as cores das roupas de meninos e meninas que virou piada internacional. No dia seguinte a ministra ainda deu uma entrevista demostrando completa falta de preparo ao falar sobre as denominações de gênero. Na sequência, sua fala sobre quem são as bonitas ou as feias, e ainda de que as feministas não gostam de homens porque são feias. Ora, recusamos a imposição de padrões de beleza, portanto feio é o preconceito.
Logo surgiram críticas à importância exagerada dada à fala de Damares. O argumento apresentado  ressaltava que o “debate central" é o da economia.  Afirmava que, neste momento, saber o que Paulo Guedes está fazendo é o mais importante, pois a Ministra das Mulheres seria uma desequilibrada fazendo cortina de fumaça para as pautas principais, etc. Ninguém em sã consciência duvida da importância de estarmos atentas/os ao que se passa em qualquer ministério. Muito menos um que é dirigido por um homem da extrema direita.
Mas Damares não é insana. Ela não é ignorante sobre o que fala, muito pelo contrário. Ela é uma estrategista e não está fazendo apenas cortina de fumaça. Está sim escancarando o pensamento conservador que assola o Brasil e seu crescente fanatismo religioso. “O Estado é laico, mas esta ministra é terrivelmente cristã”, diz Damares Alves em uma fala em que declara que irá governar com "princípios cristãos", sempre priorizando a família. Bem, se o Estado é Laico, como podemos tolerar a imposição de uma única crença e, pior, como orientadora das políticas públicas?
Desde suas origens, o feminismo enfrenta permanentemente as forças conservadoras que impõem modelos capitalistas, racistas e patriarcais de corpo, sexualidade e comportamento, de organização do trabalho e da família.
Mas só tentar ridicularizar as ideias feministas elaboradas ao longo da história da humanidade não é suficiente. Evidentemente, o alvo sempre será diretamente “as feministas”! São as feministas que lutaram pelo direito de todas as mulheres ao voto - as sufragistas, foram as que denunciavam as jornadas de trabalho abusivas, a violência doméstica, o direito de decidir sobre seu corpo. Logo, as feministas metem medo.
Governos autoritários, que servem de olhos vendados ao capital sempre precisaram reforçar o lugar da mulher como cuidadora na família, parindo muitos filhos, dependente economicamente dos maridos, além de arcar sozinhas com as tarefas domésticas. A ideia da família tradicional patriarcal dá sustentação ao capitalismo através do trabalho doméstico e de cuidados não pago, tão necessário a este sistema de exploração que vivemos. O capitalismo, patriarcal e racista, se reestrutura permanentemente como em sua origem, usando mecanismos violentos de acumulação que são a exploração do trabalho, a apropriação dos bens comuns, o controle sobre o corpo e a sexualidade das mulheres, a violência e o poder militar – institucional e bélico.
É fundamental enxergarmos o papel ideológico do Ministério da Mulher, por exemplo, que tem na sua denominação “família”, que significa reforçar a ideia de família tradicional de propaganda de margarina, invisibilizando tantas outras formas de organização familiar que existem em nossa sociedade.
As primeiras falas atrapalhadas do governo apontam qual o objetivo central – a reforma da previdência, privatizações, extinção de todos os órgãos que atendem populações tradicionais como indígenas e quilombolas, extinção do ministério da cultura, eliminação de políticas para a população LGBTT, o estatuto do nascituro, além de estarem na contramão dos avanços pedagógicos em relação à educação, que na fala da Ministra diz "vamos acabar com o abuso da doutrinação ideológica de crianças e adolescentes no Brasil. A revolução está apenas começando." Mas isto não começou agora, vamos lembrar da batalha contra a “ideologia de gênero” onde o movimento feminista, movimento negro e o movimento LGBT travaram nos legislativos há bem pouco tempo. Alguém tem dúvidas do que isto tudo quer dizer? Será a queima de livros didáticos e todos os materiais que podem libertar o pensamento para seguirmos rumo ao obscurantismo, significando além de um “Direita, volver” serão longos 30 anos de “De volta para o passado”.
A vida das mulheres e, principalmente, das lésbicas, das negras, das indígenas, das camponesas e ribeirinhas está ainda mais em risco.  Mas, lembremos: o capital não se importa com vidas. Precisa da força de trabalho e para isto é importante para o Estado ter políticas de controle sobre os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres para seguir seu curso de expansão/exploração. Tudo está ligado e faz parte da mesma engrenagem. Achar que Damares é só fumaça seria um erro primário da oposição. Cada peça deste jogo tem seu papel e nenhum Ministro deve ser subestimado –nenhum. Principalmente Damares Alves, esta, não pode sair da nossa vista. Precisamos estar nas ruas e nos opor de forma organizada e sistemática aos seus princípios, estudar cada passo deste governo, seguir suas ações e principalmente saber explicar para as outras mulheres o que está acontecendo.
Estaremos nas ruas de todo o Brasil e fora dele, onde já temos muitas manifestações de apoio.
Marchemos unidas, numa só voz, pois somos todas Resistência.
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 *Vanessa Gil, Doutoranda em Educação - PPGEDU/Unisinos - Militante da MMM RS

** Cláudia Prates - Educadora Popular, Militante da MMM RS