quinta-feira, 31 de maio de 2012

Abertas as inscrições para as eleições do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher do RS


Estão abertas as inscrições para a sociedade civil participar do Processo Eleitoral do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher (CEDM/RS), vinculado à Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM/RS), conforme publicação do Regimento Eleitoral para Eleições do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher do Rio Grande do Sul (anexo).
A documentação exigida deve ser enviada, por Sedex ou Correspondência Registrada, contendo no envelope a observação “Eleição do CEDM”, para o Conselho Estadual dos Direitos da Mulher, localizado na  Rua Miguel Teixeira, nº 86, no Bairro Cidade Baixa de Porto Alegre (CEP 90050-250). É franqueada a entrega em mãos, em envelope fechado, mediante protocolo, bem como o envio por email, desde que todos os documentos estejam digitalizados e em formato PDF. Não serão recebidos documentos por FAX. O prazo final para recebimento das inscrições é de 05 (cinco) dias úteis a contar da data da publicação do regimento no Diário Oficial (31 de maio de 2012).
Conforme prevê a Lei nº 13.947/2012, o Conselho será composto por 33 conselheiras, 11 representantes de órgãos do Governo do Estado, oito representantes da sociedade civil eleitas no Fórum Estadual da Mulher e 14 representantes de entidades da sociedade civil relacionadas com a promoção e defesa dos direitos da mulher, eleitas nos fóruns regionais.
Estão previstas para o dia 16 de junho as eleições regionais de entidades não governamentais nos municípios de Passo Fundo, Santana do Livramento, Santa Rosa, Caxias, Fontoura Xavier, Vacaria, Palmeira das Missões e Santiago. No dia 23 de junho, estão previstas eleições em Santa Cruz, Capão da Canoa, Taquara, Pelotas, Sapiranga e, em Porto Alegre, das regionais Metropolitana e Delta do Jacuí. As eleições das representantes do Fórum Estadual da Mulher acontecerá, no dia 23 de junho, à tarde, na Capital. As entidades somente poderão optar por concorrer a uma regional ou para uma vaga no Fórum Estadual.
Informações sobre o Processo Eleitoral, incluindo período e local das inscrições, documentos exigidos para a habilitação, lista de entidades habilitadas, prazos de recursos, locais onde ocorrerão as eleições regionais e o regimento estarão todas disponíveis no site da Secretaria de Políticas para as Mulheres do RS www.spm.rs.gov.br, bem como em formato impresso disponível às interessadas na sede do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher - Rua Miguel Teixeira, nº 86 - Cidade Baixa -Porto Alegre - CEP 90050-250 - 55 (51) 3288-6617, podendo ainda, ser solicitado por email para o seguinte endereço eletrônico: cedm-rs@spm.rs.gov.br



Arquivos para download
Lei do CEDM (87 kb)
Regimento Eleições do CEDM (58 kb)
Carta de Compromisso do CEDM (89 kb)
Requerimento de Inscrição do CEDM (157 kb)

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Mulheres em luta contra a mercantilização da vida e da natureza

A sociedade capitalista e patriarcal se estrutura em uma divisão sexual do trabalho que separa o trabalho dos homens e o das mulheres e define que o trabalho dos homens vale mais que o das mulheres. O trabalho dos homens é associado ao produtivo (o que se vende no mercado) e o trabalho das mulheres ao reprodutivo (a produção dos seres humanos e suas relações). As representações do que é masculino e feminino é dual e hierárquica, assim como a associação entre homens e cultura, e mulheres e natureza.
Na Marcha Mundial das Mulheres (MMM), lutamos para superar a divisão sexual do trabalho e, ao mesmo tempo, buscamos o  reconhecimento de que o trabalho reprodutivo está na base da sustentabilidade da vida humana e das relações entre as pessoas na família e na sociedade. Acreditamos que é possível estabelecer – e em alguns casos reestabelecer –  uma relação dinâmica e harmoniosa entre as pessoas e a natureza, e que as mulheres, com sua experiência histórica, têm muito para dizer sobre esse tema.
A MMM na Cúpula dos Povos
Nós estamos presentes na construção da Cúpula dos Povos como parte de um processo global de resistência ao capitalismo, que é patriarcal e racista e que hoje se expande cada vez mais para todas as esferas da vida.
Nosso objetivo com a participação nesse processo é conseguir, antes mesmo da Cúpula dos Povos, dar visibilidade aos processos de luta contra as falsas soluções e contra o capitalismo verde, cenário no qual estamos envolvidas em nossos países. E, a partir de uma posição feminista (antissistêmica e crítica), provocar um debate aberto para desmascarar as intenções das corporações transnacionais e de muitos governos em relação à economia verde, denunciando a ligação dessa proposta com o aumento da opressão das mulheres. Ao mesmo tempo, queremos dar visibilidade às propostas alternativas das mulheres para o bem viver e conviver por meio de nossa participação ativa e em aliança com os movimentos sociais.
Temos como ponto de partida os debates e as ações organizadas ao longo de nossa história como movimento, que estão sintetizados em nossos campos de ação, especialmente na questão dos bens comuns e dos serviços públicos.
Posicionamos o feminismo nos campos da crítica às falsas soluções e da crise ambiental, mas também para afirmar que o novo discurso capitalista, que hoje se traduz no termo ‘economia verde’, é o mesmo modelo de mercado que mercantiliza nossas vidas, nossos corpos e nossos territórios. Dizemos “não” às falsas soluções propostas pelo mercado e por seus agentes – como os créditos de carbono, os agrocombustíveis, os mecanismos de REDD e REDD ++ e a geoengenharia. Não aceitamos falsas soluções que só geram mais negócios e não mudam o modelo de produção, consumo e reprodução social.
Mas, também, afirmamos que as alternativas construídas e propostas pelos povos devem integrar uma dimensão geradora de igualdade. Para que as alternativas dos povos sejam globais e verdadeiras, devem contemplar a igualdade entre mulheres e homens, o direito das mulheres a uma vida sem violência e a divisão do trabalho doméstico e de cuidados entre homens e mulheres. Para isso, partimos dos conhecimentos que acumulamos na economia feminista e temos a sustentabilidade da vida humana como objetivo.
Esse debate de crítica ao capitalismo e ao desenvolvimento de alternativas não se realiza nos marcos institucionais da ONU ou em seus espaços de diálogo com a sociedade civil, que muitas vezes se restringem a adicionar cláusulas de gênero em seus tratados, em uma lógica similar ao que tem passado nas negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Acreditamos que o debate sobre alternativas só pode avançar com muito trabalho de conscientização junto às mulheres e em espaços de aliança com outros movimentos sociais que também se contrapõem e lutam contra o capitalismo, patriarcal e racista. Com esta perspectiva, estivemos presentes em vários espaços dos povos, paralelos às cúpulas oficiais como a COP (Conferencia das Partes) da Convenção sobre mudanças climáticas da ONU realizadas em Bali (2008), Copenhaguen (2009), Cancún (2010) e Durban (2011). Também participamos de processos construídos junto aos povos, em especial, a Cúpula dos Povos sobre Mudanças Climáticas e Direitos da Mãe Terra (Cochabamba, Bolivia, 2010) e no Fórum Social Temático Crises do Capitalismo justiça ambiental e social (Porto Alegre, Brasil, 2012).
Ações da MMM
Durante a Cúpula dos Povos, planejamos ter os seguintes espaços:
1. Alojamento da MMM para 1.000 mulheres. Será um espaço de alojamento, organização e intercâmbio, tanto para a delegação brasileira quanto para as delegadas internacionais da MMM que possam estar no Rio. Os comitês da MMM nos estados brasileiros já estão organizando atividades de formação, mobilização e de finanças para garantir a presença de suas delegações.
2. Participação nos espaços da Cúpula. Organizamos nossas atividades de forma a potencializar a construção das plenárias de convergências e da Assembleia dos Povos, garantindo que a perspectiva feminista seja parte desses processos.
3. Mobilizações. Com os movimentos sociais aliados, planejamos promover muitas ações nas ruas durante os dias da Cúpula. Estamos em processo de trabalho para visibilizar a agenda feminista nessas mobilizações. Por exemplo, na luta contra as minerações (principalmente contra a Vale), queremos denunciar como a ofensiva do capital sobre os territórios avança também sobre nossos corpos, o tema da violência, a prostituição.
No dia 18 de junho, faremos uma mobilização das mulheres, organizada com o conjunto de movimentos de mulheres do Brasil e com mulheres de movimentos mistos aliados. Nessa manifestaçao, queremos expressar um forte posicionamento feminista contra o capitalismo verde.
5 de Junho: dia de mobilização internacional
Conscientes da necessidade de gerar um processo mais amplo de crítica à economia verde, durante o Fórum Social Temático  realizado em Porto Alegre (RS), de 24 a 29 de Janeiro de 2012, a Assembleia de Movimentos Sociais definiu a construção de um dia mundial de ação comum: 5 de Junho, com o objetivo de mandar uma forte mensagem a cada um de nossos governos antes da conferência da ONU (Rio+20). Nessa data, que coincide com o Dia Internacional do Meio Ambiente, vamos destacar nossas posições, que são contrárias às políticas que servem às corporações transnacionais e implicam na mercantilização da natureza, de nossas vidas e nossos corpos, e afirmar nossas alternativas.
Como parte de nossas alianças, reforçamos nossos eixos comuns de lutas, decididos em 2011, em Dakar: contra as empresas transnacionais, pela justiça climática e soberania alimentar, pelo fim da violência contra as mulheres e contra a guerra, o colonialismo, as ocupações e a militarização de nossos territórios.
Para ler a declaração da Assembleia de Movimentos Sociais em Porto Alegre 2012, clique aqui.
No Brasil, também, durante os dias da Rio+20, movimentos e organizações têm se preparado para  realizar uma mobilização com forte presença nacional e internacional no dia 20 de junho.
Rio+20: um olhar sobre o processo oficial
Em janeiro de 2012, a ONU lançou o rascunho zero do documento preparatório para as discussões oficiais, intitulado ‘O futuro que queremos’. O documento tem muitos problemas: apresenta a economia verde e a participação do setor privado como solução para os problemas que eles mesmo criaram e criam; reafirma a Rodada de Doha da OMC, a declaração de Paris sobre cooperação internacional e a COP-17, todos acordos que reforçam o interesse das corporações. E, ao final, propõe como medidas concretas o estabelecimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. Quem acompanha o tema chama a atenção de que isso é a repetição o que foram os Objetivos do Milênio – ou seja, acordos rebaixados que colocaram no lixo todos as negociações do ciclo de conferência sociais das Nações Unidas nos anos de 1990.
Nós da MMM Brasil nunca vimos com muito entusiasmo os resultados desse ciclo de conferências. Muito nos preocupa o contrato de acordos amplamente aceitos que criam as bases para novos negócios, como foi, por exemplo, o Acordo de Dublin e a posterior expansão da privatização dos serviços de água.
No processo oficial da Rio+20, há um Major Group de mulheres. Elas apresentaram suas contribuições para o rascunho zero em novembro de 2011. Nesse documento há considerações de medidas concretas com as quais em parte estamos de acordo – como, por exemplo, a proposição de medidas concretas para a rápida redução e eliminação dos subsídios a energias não sustentáveis (por exemplo, a nuclear); a afirmação do princípio de precaução; a necessidade de proteção aos sistemas de conhecimento tradicionais das mulheres indígenas frente a sua exploração pelas corporações. O grupo é critico do termo “economia verde”, propõe substituí-lo por “economia equitativa e sustentável” e descreve seus princípios. Além disso, as mulheres chamam a atenção sobre os limites do Produto Interno Bruto (PIB) como medida de bem-estar e propõem indicadores para avaliar os impactos de gênero.
Contudo, todas essas contribuições não aparecem no rascunho zero da ONU, que só faz uma referência genérica à desigualdade de gênero, mencionando que o desenvolvimento sustentável depende da contribuição das mulheres, que é necessário remover barreiras que impedem as mesmas de serem participantes integrais na economia e priorizar medidas que promovam a igualdade de gênero. O rascunho zero também incorpora a necessidade de desenvolver indicadores que contemplem de uma só vez o econômico, o ambiental, e o social.
Consideramos que uma análise restrita aos impactos diferentes de gênero pode se limitar a uma descrição dos impactos positivos e negativos de uma maneira fragmentada. Por exemplo, no ápice da globalização neoliberal, o aumento do trabalho remunerado das mulheres nas máquillas e a agricultura de exportação eram vistos como efeitos positivos: as mulheres tinham um rendimento próprio e por isso era mais provável que tivesse maior autonomia. Porém, havia também impactos negativos, sobretudo nas condições precárias de trabalho. Nessa lógica, se propõem medidas que equilibram os aspectos positivos e negativos. Mas nós priorizamos um olhar que analisa como o capitalismo faz uso de estruturas patriarcais no seu atual processo de acumulação e, por isso, construímos uma luta e resistência feminista e anticapitalista.
Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres!

terça-feira, 29 de maio de 2012

3ª Plenária de Mobilização para a Cúpula dos Povos


O Estupro nosso e a Justificativa de Cada Dia

por Vanessa Gil *


Não, esse texto não é sobre a Xuxa, é sobre preconceito, misoginia, sexismo. É sobre a incapacidade de discernimento de algumas pessoas. Sobre oportunismo de outras. Sobre a ignorância de todas elas.
No domingo, 20 de maio, no Fantástico, a Xuxa revelou ter sofrido abusos sexuais na infância, mais de uma vez, por um amigo do pai e por um professor. Não me interessa o que a Xuxa representa, o que a Globo representa, o que o Fantástico representa. Importa o que o abuso sexual sofrido por qualquer mulher representa para o meu feminismo, para mim. Não relativizo violência contra mulheres. Não há mais violência, menos violência, há machismo e preconceito.
O que é emblemático nesse caso são as justificativas usadas para tirar a misoginia do armário. O assunto tomou conta das redes sociais com as piadas politicamente incorretas fazendo sucesso, surgindo a afirmação de que o caso foi inventado apenas para desviar o olhar público sobre a última CPI. É tão absurdo que não merece nem argumentação. Outras publicações sugerem que ela não merece crédito poque namorou o Senna, o Pelé, ou a Marlene Matos. Como dizemos na Marcha Mundial das Mulheres: Se o corpo é da mulher, ela dá para quem quiser, inclusive para outra mulher. Mas é para quem ela quiser mesmo, e só se ela quiser. E falamos de mulheres adultas. Mulheres jovens, crianças, masculinas ou femininas, não desejam ser abusadas, são sempre as vítimas.
A Xuxa mentiu, dizem muitos, para aumentar o Ibope da Globo. Ora, a Globo tem seu gado cativo, precisa bem menos do que isso para segurar o olhar d@s telespectador@s. Não acredito que uma mulher invente um abuso sexual, um caso de pedofilia, algo tão horroroso assim, apenas para ganhar pontos no IBOPE. Há formas bem mais prazeiras e menos humilhantes de chamar muito mais a atenção, de causar polêmica.
Outro ponto curioso dessa misoginia nas redes sociais é que grande parte das pessoas que hoje compartilham fotos da Xuxa com piadas sobre seu abuso, sua sexualidade, sua conduta moral, são as mesmas que postam convites para a Marcha das Vadias, afirmando que somos todas isso, somo todas aquilo. Infelizmente a única coisa comum a todas nós é a opressão patriarcal e capitalista. Algumas de nós tem em comum a luta para mudar esse mundo machista e androcentrico. Nenhuma de nós passa pela vida sem sofrer com o preconceito.

Espero que um dia possamos dizer que não somos nem santas, nem vadias, nem putas, porque seremos todas livres e solidárias. E que nossa conduta, qualquer que seja, não sirva de justificativa para o abuso e controle dos nossos corpos. Que poderemos, de fato, apoiarmo-nos mutuamente, reconhecendo na outra mulher a opressão que pesa sobre cada uma de nós. Que possamos exercitar solidariedade com a nossa classe até o ponto em que classes não existam mais, que sejam superadas por um mundo justo e igualitário. Mas que, até lá, a condição de mulher não seja esquecida pelas diferenças econômicas e ideológicas.
Sou solidária com a Xuxa da mesma forma que sou com todas as outras mulheres. Repudio a forma como essa sociedade machista trata o abuso da Xuxa, como trata o assassinato da Eliza Samúdio, como tratou a minha colega da 7° série que foi estuprada pelo pai e por conta disso nunca mais foi à aula. Sou solidária, só isso.


*Vanessa Gil é
Cientista Social
Militante Feminista da Marcha Mundial das Mulheres RS

sexta-feira, 25 de maio de 2012

A Marcha das Vadias e a Mercantilização do corpo e vida das mulheres


Há um ano atrás a Marcha das Vadias foi construída como uma resposta irreverente contra a responsabilização das mulheres pelas violências sofridas e a estigmatização dos corpos femininos. Potencializada pela mobilização nas redes sociais, a Marcha ganhou vários países e, no Brasil, várias cidades. Algumas conseguiram dialogar com a conjuntura local e denunciar práticas de machismo naturalizadas, como por exemplo, a denúncia da prática machista de Rafinha Bastos na televisão e em sua casa de show em São Paulo.
Passado um ano dessa movimentação é preciso refletir tanto sobre as formas como o capitalismo e o patriarcado mercantilizam a vida e o corpo das mulheres, como os instrumentos de resistências aos quais dispomos. Essa segunda tarefa passa por perceber que, muitas vezes, a violência contra as mulheres precisa de uma resposta rápida e incisiva, como se deu com a Marcha das Vadias, mas que seu enfrentamento deve ser um processo cotidiano, que vai além de um evento.
Desde o final dos anos 70, o conjunto do movimento de mulheres, através da insígnia “nosso corpo nos pertence”, buscou questionar as imposições do patriarcado sobre a autonomia das mulheres – questão de fundo da Marcha das Vadias. Essa bandeira tem significado a luta das mulheres pelo direito de viver a sua sexualidade livremente, a luta por autonomia sobre o corpo e a vida, desde o exercício autônomo do desejo e do direito ao prazer, à legalização do aborto.
Retomamos esta luta, aprofundando a compreensão da sua dimensão anti-capitalista, uma vez que denunciamos como a sociedade de mercado impõe padrões de beleza racistas e sexistas e como o mercado difunde uma ideia do corpo das mulheres como objeto - em constante ajuste, retoque, conserto.  As indústrias farmacêuticas e cosméticas acumulam lucros estrondosos, à custa da propagação da insegurança das mulheres, gerando, além de tudo, graves doenças como os distúrbios alimentares.
A associação entre capitalismo e patriarcado, que transforma as mulheres em objetos, está no centro da violência sexista. O Brasil possui o sétimo maior índice de homicídios de mulheres do mundo. Essas mulheres são assassinadas, muitas vezes, porque não se calaram diante de situações de violência ou porque exerceram sua autonomia. Conforme aponta pesquisa da Fundação Perseu Abramo (2010), a cada dois minutos 5 mulheres são espancadas no país, a cada minuto 5 mulheres sofrem assédio sexual, e a cada hora 220 mulheres são obrigadas a ter relações sexuais forçadas.
Essa situação de extrema objetificação da mulher está expressa no indignante caso de violência machista e sexista ocorrido no município de Queimadas no estado da Paraíba. Um estupro coletivo de cinco mulheres, sendo duas delas, assassinadas brutalmente por dez homens durante uma festa realizada por eles com o intuito de “presentear” o aniversariante com o estupro dessas mulheres. Este foi um ato de extremo machismo e misoginia pelo nível de crueldade, violência e desprezo pela vida das mulheres, derivados de um clima de terror que gera a perseguição e morte, caracterizados pelo abuso físico e verbal, estupro, tortura, escravidão sexual, espancamentos.  Este crime bárbaro precisa ser punido com todo rigor da lei!
Além disso, a prostituição continua sendo vista por muitos como uma forma de viver a sexualidade. Para nós, ela representa a mercantilização, violência e subjulgação as quais as mulheres são submetidas. Sabemos que a indústria do sexo é um setor internacionalmente articulado, que gera lucros enormes e é associado ao tráfico de drogas, armas, corrupção e esquemas de crime organizado e sobrevive da exploração massiva do corpo de mulheres e crianças.  Somos solidárias às mulheres que são vítimas dessa forma de exploração da sociedade patriarcal, mas é preciso perceber que a prostituição só existe em um sistema que se articula em torno da subordinação das mulheres e, portanto, não produz nada relacionado à liberdade e autonomia, ao contrário, a mulher se encontra escravizada por uma rede mercantilizada de controle do seu corpo e da sua vida. Essas redes funcionam como organizações criminosas que traficam e escravizam na sua maioria mulheres jovens negras entre 17 e 27 anos.
Essas formas materiais e simbólicas que constituem a opressão das mulheres na conjuntura atual revelam a necessidade de formas de mobilização e instrumentos de resistência que ultrapassem os limites da Marcha das Vadias. Essa resistência tem sido forjada há anos pelo conjunto dos movimentos de mulheres, pela articulação de mulheres nos movimentos mistos e pelas alianças entre movimentos que tem na sua base a luta por outro sistema. Não é possível “resolver” a opressão das mulheres, nos auto-intitulando “todas vadias”. Mas é preciso aprender com as novas formas de articulação, potencializadas pelas tecnologias da informação e comunicação, atualizando nossas formas de ação.
É preciso reafirmar a importância da auto-organização e resistência das mulheres para construção de um mundo baseado na igualdade, na solidariedade e livre de violência. É preciso fortalecer a nossa luta cotidiana contra a mercantilização das mulheres.
Negamos a falsa liberdade, oferecida pelo mercado, que se encerra unicamente na ideia de não ter impedimentos para a ação. Esta idéia está na base da banalização da sexualidade, tornando-a mais um produto a serviço dos lucros. Temos que ir além disso. É preciso construir a liberdade como condição necessária para a igualdade e como condição da autonomia tanto coletiva como individual das mulheres. Somente a partir desta compreensão é que faz sentido seguir em marcha até que TODAS sejamos livres!
Assim, estamos em constante luta para que as mulheres não sejam caracterizadas como vadias por sair dos padrões de comportamento, nem como qualquer outro símbolo que as menospreze e as diminua.  Reafirmamos o direito de todas as mulheres viverem livre de estigmas, estereótipos, violência e exploração!!!

sábado, 19 de maio de 2012

O que está em jogo na Rio+20


A um mês da conferência das Nações Unidas Rio+20, os povos do mundo não veem resultados positivos no processo de negociação que está ocorrendo na conferência oficial. Ali não se está discutindo um balanço do cumprimento dos acordos alcançados na Rio 92, ou como mudar as causas da crise. O foco da discussão é um pacote de propostas enganosamente chamado de “economia verde” e a instauração de um novo sistema de governo ambiental internacional que o facilite.
A verdadeira causa estrutural das múltiplas crises é o capitalismo, com suas formas clássicas e renovadas de dominação, que concentra a riqueza e produz desigualdades sociais, desemprego, violência contra o povo e a criminalização de quem os denuncia. O sistema de produção e o consumo atual – representados por grandes corporações, mercados financeiros e os governos que garantem sua manutenção – produzem e aprofundam o aquecimento global e a crise climática, a fome e a desnutrição, a perda de florestas e da diversidade biológica e sócio-cultural, a contaminação química, a escassez de água potável, a desertificação crescente dos solos, a acidificação dos mares, a grilagem de terras e a mercantilização de todos os aspectos da vida nas cidades e no campo .
A “economia verde”, ao contrário do que o seu nome sugere, é outra fase da acumulação capitalista. Nada na “economia verde” questiona ou substitui a economia baseada no extrativismo de combustíveis fósseis, nem os seus padrões de consumo e produção industrial. Essa economia estende a economia exploradora das pessoas e do ambiente para novas áreas, alimentando assim o mito de que é possível o crescimento econômico infinito.
O falido modelo econômico, agora disfarçado de verde, pretende submeter todos os ciclos vitais da natureza às regras do mercado e ao domínio da tecnologia, da privatização e da mercantilização da natureza e suas funções. Assim como dos conhecimentos tradicionais, aumentando os mercados financeiros especulativos através dos mercados de carbono, de serviços ambientais, de compensações por biodiversidade e o mecanismo REDD+ (Redução de emissões por desmatamento evitado e degradação florestal).
Os transgênicos, os agrotóxicos, a tecnologia Terminator, os agrocombustíveis, a nanotecnologia, a biologia sintética, a vida artificial, a geo-engenharia e a energia nuclear, entre outros, são apresentados como “soluções tecnológicas” para os limites naturais do planeta e para as múltiplas crises, sem abordar as causas verdadeiras que as provocam.
Além disso, se promove a expansão do sistema alimentício agroindustrial, um dos maiores fatores causadores das crises climáticas, ambientais, econômicas e sociais, aprofundando a especulação com os alimentos. Com isso se favorece os interesses das corporações do agronegócio em detrimento da produção local, campesina, familiar, dos povos indígenas e das populações tradicionais, afetando a saúde de todos.
Como uma estratégia de negociação na conferência Rio+20, alguns governos de países ricos estão propondo um retrocesso dos princípios da Rio 92, como o princípio de responsabilidades comuns e diferenciadas, o princípio da precaução, o direito à informação e participação. Estão ameaçados direitos já consolidados, como os dos povos indígenas e populações tradicionais, dos camponeses, o direito humano à água, os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, dos imigrantes, o direito à alimentação, à habitação, à cidade, os direitos da juventude e das mulheres, o direito à saúde sexual e reprodutiva, à educação e também os direitos culturais.
Está se tentando instalar os chamados Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que serão utilizados para promover a “economia verde”, enfraquecendo ainda mais os já insuficientes Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM).
O processo oficial propõe estabelecer formas de governança ambiental mundial que sirvam como administradores e facilitadores desta “economia verde”, com o protagonismo do Banco Mundial e outras instituições financeiras públicas ou privadas, nacionais e internacionais, que irão incentivar um novo ciclo de endividamento e ajustes estruturais disfarçados de verde. Não pode existir governança global democrática sem terminar com a atual captura corporativa das Nações Unidas.
Repudiamos este processo e conclamamos todos para que venham fortalecer as manifestações e construções de alternativas em todo o mundo.
Lutamos por uma mudança radical no atual modelo de produção e consumo, consolidando o nosso direito para nos desenvolvermos com modelos alternativos com base nas múltiplas realidades e vivências dos povos, genuinamente democráticas, respeitando os direitos humanos e coletivos, em harmonia com a natureza e com a justiça social e ambiental.
Afirmamos a construção coletiva de novos paradigmas baseados na soberania alimentar, na agroecologia e na economia solidária, na defesa da vida e dos bens comuns, na afirmação de todos os direitos ameaçados, o direito à terra e ao território, o direito à cidade, os direitos da natureza e das futuras gerações e a eliminação de toda forma de colonialismo e imperialismo.
Conclamamos todos os povos do mundo a apoiarem a luta do povo brasileiro contra a destruição de um dos mais importantes quadros legais de proteção às florestas (Código Florestal), o que abre caminhos para mais desmatamentos em favor dos interesses do agronegócio e da ampliação da monocultura; e contra a implementação do mega projeto hidráulico de Belo Monte, que afeta a sobrevivência e as formas de vida dos povos da selva e a biodiversidade amazônica.
Reiteramos o convite para participação na Cúpula dos Povos que se realizará de 15 a 23 de junho no Rio de Janeiro. Será um ponto importante na trajetória das lutas globais por justiça social e ambiental que estamos construindo desde a Rio-92, particularmente a partir de Seattle, FSM, Cochabamba, onde se têm catapultado as lutas contra a OMC e a ALCA, pela justiça climática e contra o G-20. Incluímos também as mobilizações de massa como Occupy, indignados, a luta dos estudantes do Chile e de outros países e a primavera árabe.
Convocamos todos para que participem da mobilização global de 5 de junho (Dia Mundial do Ambiente); da mobilização do dia 18 de junho, contra o G20 (que desta vez se concentrará no “crescimento verde”) e na marcha da Cúpula dos Povos, no dia 20 junho, no Rio de Janeiro e no mundo, por justiça social e ambiental, contra a “economia verde”, a mercantilização da vida e da natureza e em defesa dos bens comuns e dos direitos dos povos.
Rio de Janeiro, 12 de maio de 2012
Assinam:
Grupo de Articulação Nacional e Internacional da Cúpula dos Povos por Justiça Social e Ambiental*.

Concorda com os pontos desta carta? Envie um e-mail para gainter@rio2012.org.br e peça a inclusão do nome da sua entidade na assinatura.
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*O Grupo de Articulação (GA) Internacional do Comitê Facilitador para a Sociedade Civil na Rio+20 (CFSC) da Cúpula dos Povos é formado por 35 redes, organizações e movimentos sociais de 13 diferentes países. Seus representantes trabalham junto ao GA Nacional (com 40 redes representadas) na coordenação metodológica e política da Cúpula dos Povos, evento paralelo e crítico à Rio+20, que vai reunir milhares de pessoas no Aterro do Flamengo, de 15 a 23 de junho.