segunda-feira, 3 de agosto de 2009
Gênero e Meio Ambiente
Cíntia Barenho*
A proposta da minha fala é instigar e problematizar sobre a importância dos movimentos feministas e que militam na temática de gênero, discutirem e se apropriarem dos temáticas ambientalistas ou socioambientalistas.
Mas o porquê dessa importância?
É fato que a relação de homens e mulheres com o meio ambiente é diretamente determinada pelos papéis que cada um desempenha numa dada sociedade, o que implica, também, em diferentes formas de acesso, de conhecimentos adquiridos de manejo dos recursos naturais. Também por causa disso, é possível afirmarmos que os impactos da degradação ambiental afetam de forma distinta as mulheres e homens.
No entanto, antes de conversamos sobre isso é preciso atentarmos ao fato que o senso comum tende a atribuir às mulheres uma relação mais estreita com a natureza e ao homens um lugar mais próximo à cultura e à esfera produtiva, como o responsável natural pela provimento da família. A associação das mulheres à natureza se fundamenta, devido ao seu papel reprodutivo e de educadora dos filhos. Logo, a esfera de atividades das mulheres se reduz ao doméstico, enquanto que a esfera dos homens se situa no político e público.
Além disso, o pressuposto que as mulheres são parte harmônica do meio ambiente, restringe a análise e sobrecarrega as mulheres com a responsabilidade de garantir a preservação e conservação ambiental (devido a crença de seu maior vínculo com a natureza). Fora que isso subestima a necessidade de efetivas mudanças nos padrões de uso dos recursos naturais, bem como, do papel dos homens nesse contexto.
É preciso olhar criticamente para que desnaturalizemos a relação mulher e natureza, sem deixar de refletirmos sobre as peculiaridades de percepção e inserção feminina no ambiente.
Mulheres e homens atuam, percebem e são influenciados de forma diferenciada sobre o ambiente. Isto é devido a posição que ocupam na sociedade e não uma condição natural, ou seja, é determinada culturalmente. E isso enfatiza que há desigualdades de relações entre homens e mulheres.
Falar de gênero e ambiente é falar de transformação social e ambiental, onde todos e todas possam ter relações eqüitativas, possam ter o mesmo direito de oportunidades e também possam ter acesso aos recursos naturais de forma equilibrada e sustentável.
E o que a gente vê hoje? Vou apresentar apenas um exemplo bem local. Aqui no Rio Grande do Sul o governo estadual voltou todas as suas fichas para o famigerado setor da Celulose e Papel. Este pretende gerar nosso Pampa num imenso deserto verde e mais, instalar pelo menos 3 fábricas de celulose e papel, que são extremamente degradadoras do ambiente (o que é desmentido, obviamente, pelos que querem se beneficiar dela). Felizmente com a atual crise financeira o processo foi suspenso temporariamente é claro.
Tal setor legitima o Modelo Capitalista de Desenvolvimento sobre os países do Sul que nós da Marcha tanto nos opomos e protestamos, pois é um modelo que:
Apropria-se de forma racista, homofóbica e sexista;
Fundamenta-se numa visão que considera o econômico apenas as atividades mercantis;
Desconsidera a reprodução e invisibiliza o trabalho das mulheres;
Pactua-se com a criminalização dos movimentos sociais, especialmente das mulheres gaúchas;
Onde a política econômica se orienta pela opção exportadora, apoiada fortemente pelo Estado e países do Hemisfério Norte.
Além de ter uma concepção de desenvolvimento baseada na idéia de crescimento econômico ilimitado, onde o mercado e o lucro privado são priorizados em detrimento do interesse público e dos direitos humanos fundamentais;
Em recente estudo de caso que coordenei, junto com o Núcleo Amigos da Terra e WRM (Entidade do Uruguai) foi possível constatar o quanto a expansão do setor da celulose e papel, mesmo sendo um processo recente, tem gerado uma série de impactos sobre as mulheres. A expansão da silvicultura (como também é denominada) tem contribuído para o desempoderamento das mulheres: “em se tratando de trabalho para as mulheres, os números são pífios; além das condições de trabalho são precárias, os contratos são temporários, ou seja, praticamente sem garantias trabalhistas. É grande exploração da força de trabalho, principalmente sobre as mulheres trabalhadoras dos viveiros de mudas da sua join-venture Aracruz, além de que estas já demonstram estar a saúde comprometida”.
As mulheres, com as quais conversei, tem um papel determinante na agricultura familiar, pois são elas que realizam as mais diversificadas atividades produtivas na roça e no quintal. E também são elas, diferentemente dos homens, que conciliam as atividades produtivas com os serviços domésticos e do cuidado com a família. E elas relataram que já há escassez de água em alguns locais, contaminação por uso indiscriminado de agrotóxico, degradação do solo.
Isto evidencia o quanto as mulheres percebem e são afetadas por esses impactos de forma particular, dada as suas responsabilidades com a alimentação, higiene e saúde da família. No entanto, serem mais suscetíveis e expostas a degradação ambiental, devido ao seu papel social desempenhado, não quer dizer que as mulheres são vítimas indefesas. Isso mais uma vez, fragiliza o potencial de mudança que nós mulheres temos, podemos e devemos exercer. Isso só faz prevalecer uma figura de vítima e não de protagonista, de cidadã.
O enfoque de gênero, o enfoque feminista, nas políticas públicas de meio ambiente tenciona, não só um entendimento dos diferentes papeis de homens e mulheres, mas propicia uma participação igualitária nos processos decisórios, das medidas a serem tomadas e dos benefícios a serem propiciados.
Enfim, nós mulheres, devemos não só desempenhar um papel de crítica ao modelo de desenvolvimento vigente, mas de proponentes na construção de alternativas de produção sustentável, com base nos conhecimentos que detemos sobre o meio ambiente.
“MULHER A LIBERTAÇÃO VIRÁ ATRAVÉS DA NOSSA RESISTÊNCIA, RESISTÊNCIA ESSA QUE BUSCAMOS QUANDO NOS REUNIMOS E VEMOS QUE OS PROBLEMAS SÃO OS MESMOS E AS SOLUÇÕES SERÃO BUSCADAS NO COLETIVO, COLETIVO ESSE QUE CONSTRUIRÁ UMA NOVA SOCIEDADE E APONTARÁ UMA NOVA MULHER...”
o vídeo com testemunhos e imagens do Seminário Mulheres em Luta por Soberania Alimentar e Energética de agosto de 2008 está com uma versão em baixa resolução disponível nos links:
http://www.youtube.com/watch?v=J8L-ig5lfkU – parte 1
http://www.youtube.com/watch?v=d2QGvftfnwQ – parte 2
Estamos também finalizando uma versão com legendas em Inglês
*Cíntia Barenho
Mestre em Educação Ambiental/FURG
Bióloga
Skype: cycabarenho
Msn: cycabarenho@hotmail.com
Flickr: http://www.flickr.com/photos/cintiabarenho
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