quinta-feira, 22 de outubro de 2015

RISCOS E IMPACTOS NEGATIVOS DA APROVAÇÃO DO PL 5069/13

PARA A VIDA DAS MULHERES E MENINAS BRASILEIRAS

Deputados e Deputadas,
É urgente que digam NÃO ao PL 5069/2013, pois sua aprovação significa um enorme retrocesso para a vida de mulheres e meninas.
Com o objetivo inicial de aumentar ainda mais a criminalização da interrupção da gravidez, o substitutivo do PL que agora está sob sua apreciação propõe impedir a prevenção de gravidez para os casos de estupro, ou seja, retroceder no que hoje é um direito.
Aprovar esse projeto é ser conivente com uma grave injustiça que recai sobre as vítimas de violência sexual. O Código Penal de 1940 tinha uma definição limitada quanto ao crime de estupro, que foi aprimorada com o artigo 2º da Lei 12.845, de 2013, que define estupro como “qualquer forma de atividade sexual não consentida”. O PL 5069/2013 propõe a supressão desse importante artigo e, com isso, impõe às mulheres e meninas a necessidade de exame de corpo de delito para comprovar a violência sexual.
Se os senhores aprovarem esse PL, mulheres e meninas serão novamente submetidas à “Via Crucis” da revitimização, da violência do Estado, para que possam “comprovar” os abusos e violências que sofreram.
Este projeto de lei expressa, em sua proposta original e no seu substitutivo, a insensibilidade, o machismo e a truculência legislativa que desconsideram a realidade cruel da violência sexual contra mulheres e meninas. Na prática, serão negados procedimentos de atenção em saúde importantes para que vítimas de violência possam retomar suas vidas, tais como a anticoncepção de emergência e o direito ao aborto legal eseguro nos casos já previstos em lei. Que utilidade pública teria essa nova legislação além de impor ainda mais sofrimento às mulheres e meninas?
A proposta ainda penaliza os (as) profissionais de saúde que realizarem o atendimento. Dessa forma, aqueles (que) que porventura auxiliem nos casos de aborto (mesmo previstos em lei) teriam pena que vai de 5 a 10 anos de prisão. Um verdadeiro absurdo!
Essa proposta é, sem dúvida, inconstitucional, visto que a dignidade da pessoa humana é fundamento do Estado Democrático de Direito. De maneira complementar, o direito à saúde é garantido na Constituição Federal em sua integralidade, portanto as vítimas de violência têm direito a um atendimento à saúde digno e integral, não lhes podendo ser negado nenhum acesso a meios, métodos ou insumos que visem a melhoria da sua condição de saúde.
Senhores Deputados, negar o atendimento dos casos de violência sexual e/ou abortamento é omissão de socorro e criminalizar os (as) profissionais de saúde que prestam essa assistência é, mais uma vez, colocar em risco a vida das mulheres brasileiras.
Para os devidos esclarecimentos: o método de anticoncepção de emergência (AE) que se pretende proibir, também conhecido por “pílula do dia seguinte”, utiliza compostos hormonais concentrados e por curto período de tempo, nos dias seguintes do contato sexual. Diferente de outros métodos anticonceptivos, a AE tem indicação reservada a situações especiais ou de exceção, com o objetivo de prevenir gravidez inoportuna ou indesejada, como nos casos de estupro. Ou seja, é indicada para que a vítima não seja obrigada ao risco e consequência de uma gravidez advinda de violência sexual.
Esse atendimento em saúde é o que se chama de “profilaxia da gravidez”! Portanto, é importante que se esclareça que profilaxia da gravidez não é aborto.
Por fim, lembramos a Vossas Excelências que, somente 2013, foram notificados 22.914 casos de violência sexual contra pessoas do sexo feminino. Em 33,4% dos casos as vítimas foram meninas de 10 a 14 anos; em 33,4% dos casos, meninas de 15 a 19 anos e; em 23,3% dos casos, mulheres de 20 a 59 anos.
É por razões como esta que o PL 5069/2013 não pode prosperar!
Isso é o que metade desta nação, mulheres e meninas brasileiras, esperam dos/as Deputados e Deputadas.
Assinam esta nota:

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Oficina Mulheres Negras em Marcha - Pelo direito ao corpo e à Vida das Mulheres

2015 - Marcha das Mulheres Negras

Marcha Mundial das Mulheres RS está se preparando para participar daMarcha das Mulheres Negras 2015, que acontecerá dia 18 de novembro em Brasilia.

Para isto estamos convidando a todas as marchantes para a Oficina Mulheres Negras em Marcha - Pelo direito ao corpo e à Vida das Mulheres, que ocorrerá dia 27 de outubro em Porto Alegre. 

Esta atividade faz parte da Jornada de Formação Feminista, onde a MMM RS trará todos os debates que ocorreram em nossa 4ª Ação Internacional, em Santana do Livramento para que outras companheiras que não puderam estar presentes, possam agora também estar participando. Esta atividade estamos construindo em parceria com várias organizações como a CUT, Sindiserf/RS, CMP, Uampa, e é uma construção coletiva onde todas estão convidadas e são bem vindas.

Serviço:
Oficina Mulheres Negras em Marcha - Pelo direito ao corpo e à Vida das Mulheres
Data: 27 de outubro 2015 - Hora: 18:30h
Local: Auditório do SINDISERF/RS, 
Endereço: Rua General Bento Martins, 24/9º andar - Conjs. 901/902 - Centro. Porto Alegre,RS

   


O que é a Jornada de formação feminista:

Queremos trazer para nossas atividades de formação, todos os debates que participamos na 4ª Ação da MMM. Para isto a executiva estadual da MMM RS, estará organizando a Jornada de Formação Feminista, a partir deste mês de outubro. A ideia é fazermos uma atividade por mês, e resgatarmos os conteúdos das oficinas da Ação, oportunizando que todas possam debater.

A nossa primeira atividade de formação será Mulheres Negras em Marcha - Pelo direito ao corpo e à Vida das Mulheres, pois além do conteúdo queremos nos preparar para participar da Marcha Nacional das Mulheres Negras, que acontecerá em novembro, em Brasília.

Organizaremos as atividades de formação feminista com caráter estadual, mas sabemos das dificuldades em todas estarem em Porto Alegre. Neste caso, vamos contribuir com textos para que cada núcleo que quiser também possa organizar sua formação, na própria cidade.


Saudações Feministas

Marcha Mundial das Mulheres RS
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Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres!

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Virada Feminista: encerramento da 4ª Ação Internacional MMM CE/RN

Nos Polos Culturais as mulheres ocupam a cidade com muita cultura da igualdade

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Desde as 6h da manhã de hoje (17), a cidade de Mossoró (RN) respira feminismo por todos os cantos. Do centro à Lagoa do Mato, do Nova vida ao Santa Delmira, as mulheres estiveram na rua ocupando os espaços públicos e promovendo uma cultura feminista, uma cultura pela igualdade.
As atividades começaram cedinho, no Polo Margarida Alves, no Nova Vida, com a bicicletada feminista percorrendo as ruas do bairro. Em seguida, teve a transmissão ao vivo da sede do Grupo Mulheres em Ação, do programa de rádio Espaço Lilás, com a participação das mulheres da comunidade e das repentistas paraibanas Soledade e Minervina. Este polo teve ainda uma oficina sobre Feminismo e Redes Sociais, debatendo o papel da mulher na mídia convencional e como as redes podem ser uma ferramenta de combate ao que é divulgado nessa grande mídia. As mulheres do bairro estiveram em peso participando de toda a programação. Débora Raquel, militante da Marcha Mundial das Mulheres e moradora do Nova Vida comemora o sucesso do polo: “Foi muito bom ver as mulheres da comunidade envolvidas nessas atividades, ocupando as ruas na bicicletada. É importante que tenhamos atividades assim para que as mulheres possam se sentir mais livres para mostrar sua cultura, sua arte, e até mesmo para poderem andar nas ruas sem medo”.
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Ainda de manhã, simultaneamente às atividades do Polo Margarida Alves, teve o seminário com o tema “Corpos e Territórios: Resistências e Alternativas”, no qual cerca de 700 mulheres do Rio Grande do Norte e do Ceará debateram sobre as experiências das Caravanas Agroecológicas Feministas que percorreram oito municípios do RN e um do Ceará. As atividades aconteceram no polo Nísia Floresta no Centro de Mossoró. Após o seminário, ao meio-dia, as mulheres percorreram as ruas do Centro com um ato público. Conceição Dantas, da coordenação executiva da MMM, explica que “hoje estamos ocupando a cidade de Mossoró com 24 horas de cultura feminista, revertendo a lógica desta sociedade dizendo que o feminismo ocupa campo e cidade construindo cultura para a igualdade”.
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Logo em seguida, às 13h, tiveram início no bairro Lagoa do Mato as atividades do Polo Romana Barros. Lá, as mulheres participaram de uma oficina de Batucada e uma de danças típicas da cultura afro. Com os pés descalços, em contanto com o chão e de olhos fechados para ouvir e sentir o som dos tambores, as mulheres se soltaram ao som da música. Geyse Anne, da MMM do Ceará e do movimento enegrecer, que ministrou a oficina ao lado da artista mossoroense Dayane Léo, falou sobre a importância dessas danças: “A dança também é uma forma de resistência, de mostrar ancestralidade através de nossas manifestações culturais. As danças populares também servem como uma forma de organizar as mulheres, de fazer com que a nossa cultura não se perca”.
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Um exemplo do que Geyse falou pode ser visto na própria oficina, com a participação das mulheres da comunidade quilombola de Jatobá, que fica localizada no município de Patu/RN, Maria Neide, moradora de Jatobá, falou sobre as danças tradicionais da comunidade, em especial de uma intitulada como “concagada”, dança esta que foi apresentada na abertura das atividades do Polo Nísia Floresta e encantou todas as presentes. “E um prazer para nós quilombolas estar aqui, mostrando para vocês a nossa dança, que é passada de geração para geração”.
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Às 15h, simultaneamente ao Polo Romana Barros, que ainda estava rolando, teve início às atividades do polo Pagu, no Bairro Santa Delmira. Neste polo as mulheres tiveram oficinas de poesia, batucada e filtro dos sonhos. Além disso, rolou música ao vivo, com a cantora e militante da Marcha, Everlaine Rocha. E ainda teve Sarau com o coletivo Boca de Bueiro. Daniela Couto, moradora do bairro, que só conhecia a MMM através do facebook disse que ficou encantada com a atividade: “Estou gostando. Muito bom finalmente poder fazer parte dessas atividades que eu só via na internet”.
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Com tudo isso, as atividades da Virada Feminista Agroecológica e Cultural completaram 12h de programação com muito sucesso e muita cultura para a igualdade por todos os cantos de Mossoró. E isso é só metade, porque ainda tem mais 12h de programação no Polo Frida Kahlo, na praça da Catedral, no Centro, pois já está rolando a Feira de Economia Solidária e Feminista, e simultaneamente os shows culturais, que terão artistas locais, regionais e nacionais.

Leia  todas as noticias do encerramento da 4ª Ação Internacional da Marcha Mundial das Mulheres em
http://www.marchamundialdasmulheres.org.br/

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

500 mulheres em marcha na fronteira Brasil-Uruguai por aborto livre, seguro e gratuito


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Após um final de semana de atividades de formação, intercâmbio, cultura e mobilização, as feministas presentes na Primavera do direito ao corpo e à vida das mulheres, que integra a IV Ação Internacional da MMM no Brasil, saíram em marcha pelas ruas de Santana do Livramento, no Rio Grande do Sul em fronteira com o Uruguai.
O encontro tinha como eixo central o direito à autonomia das mulheres e a legalização e despenalização do aborto, pautando os enfrentamentos feministas no Brasil, Argentina e Uruguai (onde o aborto é legalizado, mas ainda existem obstáculos para a efetivação da lei para todas as mulheres). Seu encerramento marcou o dia 28 de setembro, Dia Latinoamericano e Caribenho pela Legalização do Aborto, com um dos maiores atos da data em todo o Brasil.
Com a presença de mulheres do Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, São Paulo, Argentina e Uruguai, a concentração do ato reuniu apresentações que evidenciavam as distintas realidades das regiões. Houve a interpretação de relatos de mulheres que abortaram no Brasil, coletados a partir do projeto Somos Todas Clandestinas, bem como de um relato literário sobre aborto na Argentina, produzido pelas Socorristas em Red pela recente publicação do livro Código Rosa. Também se apresentou a rapper e militante uruguaia María Apellído, com músicas sobre combate à violência e feminismo, e a Fuzarca Feminista do Rio Grande do Sul agitava a concentração com uma grande batucada.
O ato, que saiu do Parque Internacional, passou pelas ruas de Santana do Livramento e dialogou com a população, que foi receptiva e apoiou a manifestação. Diversas moradoras e moradores, ao serem questionados sobre o ato, afirmaram ser favoráveis às reivindicações e que as mulheres ainda têm muito a avançar em nosso país.
Com muita música e cartazes criativos, as mulheres exigiam uma vida livre, reivindicavam a solidariedade e a autonomia de seus corpos e sexualidades e afirmavam que não irão aceitar mais retrocessos no Brasil. O ato se encerrou no Parque, onde uma grande ciranda feminista ultrapassou as fronteiras geográficas e reforçou a união latino-americana por um mundo de igualdade e liberdade.

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

DOCUMENTO FINAL: Primavera pelo Direito ao Corpo e a Vida das Mulheres

Somos clandestinas, estamos em marcha, seremos livres! Documento da Primavera pelo Direito ao Corpo e a Vida das Mulheres

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Somos mulheres argentinas, brasileiras e uruguaias em marcha por autonomia e liberdade. Nos encontramos entre os dias 26 e 28 de setembro de 2015 na Primavera pelo Direito ao Corpo e a Vida das Mulheres, que é parte da Quarta Ação Internacional da Marcha Mundial das Mulheres no Brasil.
Nesta ação, estamos construindo e fortalecendo a defesa dos territórios das mulheres, que são nossos corpos, os lugares aonde vivemos, trabalhamos e desenvolvemos nossas lutas, nossas relações e nossas histórias.
Nos encontramos na fronteira Brasil-Uruguai, em Santana do Livramento-Rivera, para colocar em prática o sentido da palavra fronteira como espaço comum e compartilhado, na perspectiva da integração dos povos. Somos mulheres que compartilhamos uma realidade de controle sobre os nossos corpos, nossa sexualidade e nossas vidas, mas também a força, a teimosia e a irreverência feminista que muda o mundo.
O aborto faz parte da vida das mulheres. Estamos em luta pelo fim da hipocrisia e do fundamentalismo religioso que hoje criminaliza pune e mata milhares de mulheres, principalmente as pobres e negras, pela clandestinidade do aborto.
Enquanto a criminalização do aborto nos empurra para a clandestinidade, a solidariedade entre as mulheres salva vidas e garante nossa autonomia. Inspiradas pelas companheiras argentinasSocorristas en Red, nos comprometemos a disputar os sentidos do aborto, como uma experiência de autonomia e autodeterminação.
Com as companheiras uruguaias reconhecemos os avanços mas também conhecemos os limites da lei que legalizou parcialmente o aborto em 2012. As mulheres uruguaias se deparam com uma série de obstáculos e limites para ter acesso a esse direito. Nossa defesa da legalização do aborto é para que sejam as mulheres que decidam os rumos da sua vida, e não os médicos, o Estado ou as igrejas.
Sentimos em nosso cotidiano os efeitos do poder médico e da indústria farmacêutica que nos vendem pílulas para todos os tipos de dor, mas que nos afastam da possibilidade de praticar a decisão sobre a maternidade de forma autônoma. Recuperamos os saberes das mulheres e intercambiamos experiências de promoção da saúde das mulheres. Recuperamos os saberes e a ancestralidade das mulheres negras e fortalecemos na prática a construção de um feminismo antirracista que ainda tem muitos caminhos por percorrer.
Construímos nestes 3 dias resistência e solidariedade com a nossa auto-organização como mulheres. Conhecendo as experiências das mulheres e revelando nossas vozes e nossa diversidade, estamos convencidas de que o direito ao aborto é fundamental para nossa autonomia. O aborto é uma experiência que faz parte das nossas vidas, e estamos em luta para que seja uma experiência vivida de forma autônoma, segura e que seja respeitada por toda a sociedade.
O encontro de mais de 500 mulheres em movimento pela legalização do aborto é em si uma resposta ao conservadorismo que se apresenta hoje nas diferentes esferas da nossa sociedade. Reafirmamos a defesa do Estado Laico: as leis não devem ser influenciadas pela religião.
Afirmamos que a defesa e a conquista de nossa autonomia é um assunto tão urgente como o enfrentamento a crise econômica e política. Não deixaremos esta luta para depois! Nos somamos ao conjunto dos coletivos, movimentos de mulheres, movimentos sociais e feministas de todos os matizes no repúdio à possibilidade de rebaixamento da Secretaria de Política para as Mulheres, sendo absolutamente contra a fusão da SPM, SEPPIR, SDH e Secretária da Juventude em um único ministério, com recursos centralizados e fora do controle de cada uma destas pastas. Afirmamos que isso significa uma grande retrocesso, uma derrota simbólica para as mulheres e uma vitória estrondosa de setores obscurantistas, conservadores e misóginos, que hoje trabalham para derrubar tudo o que construímos em termos de estruturas de atendimento e de políticas públicas nos municípios, nos estados e, agora, na União.
Denunciamos todas as iniciativas e os projetos de lei que são apresentados no Congresso Nacional para cercear ainda mais nossa autonomia e liberdade, reduzindo direitos civis de LGBTs, atacando as mulheres e a população indígena e buscando reduzir a possibilidade de direito de decisão ao aborto: é inadmissível que as mulheres, adolescentes ou adultas vítimas de violência sexual, tenham negado o acesso à contracepção de emergência. Da mesma forma, também é absurdo que aquelas que acompanham estas mulheres que decidem abortar sejam criminalizadas, e que em nome de uma vida em potencial as vidas concretas das mulheres – seus desejos, projetos e relações – sejam descartadas. É ainda inadmissível que as mulheres continuem ameaçadas com a possibilidade de não poder fazer aborto fruto de um estupro.
Somos mulheres e não mercadorias, somos mulheres e não incubadoras. Dizemos basta ao tratamento dado aos nossos corpos como disponíveis para os homens e para o sistema capitalista e patriarcal. Nossos corpos não podem continuar sendo tratados como territórios de experimentos da indústria farmacêutica que caminha de mãos dadas com a indústria dos agrotóxicos que envenena os alimentos, contamina a terra e expulsa as camponesas e indígenas de seus territórios. Resistimos à combinação nefasta do mercado com o machismo e o racismo que colonizam nossos corpos e nossos territórios.
Pela autonomia e autodeterminação dos nossos corpos, estamos em marcha pelo fim da violência contra as mulheres! Denunciamos os feminicídios, a lesbo-bi-transfobia que se expressa de forma violenta no cotidiano daquelas mulheres que ousam questionar a imposição da heterossexualidade e os papéis sociais de gênero. A superação da heteronormatividade é uma condição para que todas sejamos livres!
De Santana do Livramento, no Rio Grande do Sul, nos somamos as nossas companheiras do Ceará e Rio Grande do Norte que entre os dias 15 e 17 de outubro realizam a última etapa da quarta ação internacional da MMM no Brasil, afirmando nossas resistências e alternativas, em defesa dos nossos corpos e territórios. E, em 18 de novembro, reforçaremos nosso compromisso na construção de um feminismo antirracista na Marcha das Mulheres Negras.
 Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres!
 Santana do Livramento, 28 de setembro de 2015

Margaridas em Marcha contra o Fim da SPM: Carta à presidenta Dilma Rousseff

É com o sentimento de força, coragem e ousadia das Margaridas que viemos, neste momento de extrema tensão política em nosso país, mostrar nosso descontentamento frente à forma como está se dado a reestruturação dos ministérios. Para nós está explícito que mais do que uma crise econômica, vivemos uma crise política, onde vemos retroagir as forças da esquerda brasileira. Estamos estarrecidas ao vermos a iminência de espaços estratégicos sejam ocupados por partidos que, mesmo se apresentando como aliados, estão usando cargos como moeda de troca, sem nenhum compromisso com a qualidade de políticas essenciais e com os direitos conquistados pelo povo.

Desde as eleições temos convivido com o fantasma diário do “impeachment” e com ameaças de retrocessos em direitos, preocupações que tivemos a oportunidade de externar em nossa reunião antes da Marcha das Margaridas.

É com a certeza de que temos, como movimento social, cumprido nosso papel na defesa intransigente da Democracia, e, em especial, na luta do enfrentamento a todas as formas de discriminação, violência e opressão contra as mulheres, que afirmamos que nós, mulheres, não podemos pagar por essa crise!

Por isso, vimos, uma vez mais, explicitar que compreendemos que a proposta de fusão das secretarias SPM – Secretaria de Políticas para as Mulheres, a SEPPIR – Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, SDH- Secretaria de Direitos Humanos e Secretaria de Juventude em um único Ministério significa uma grande perda no avanço que construímos no sentido de dar visibilidade, força e efetividade às políticas para estas pessoas, em especial as mulheres negras e rurais, que tem sido historicamente discriminadas e excluídas. Estivemos, em todas as nossas ações da Marcha das Margaridas, manifestando nossa contrariedade com esta ação, já realizada em muitos estados e municípios, que nos indica um retrocesso na luta das mulheres. Tais fusões além de invisibilizar o trabalho das e com as mulheres, por vezes chegam a delegar a coordenação dos trabalhos com as mulheres a homens, dificultando a propriedade sobre nossas questões e resultando na diminuição de recursos, e, consequentemente, do desenvolvimento das ações de empoderamento e fortalecimento da autonomia política, econômica e social e do enfrentamento à violência contra as mulheres.

Não esperamos ver tal retrocesso, também em nível nacional, em especial no que se refere à ameaça do fim da SPM – Secretaria de Políticas para as Mulheres quando temos, pela primeira vez, uma mulher à frente da Presidência da República. Além disso, vemos que os impactos financeiros não serão de grande relevância, não sendo a fusão de ministérios solução real para resolver o desafio econômico que vivenciamos. Outras medidas como a taxação de grandes fortunas poderiam responder de fato a um maior equilíbrio financeiro nacional frente ao cenário de crise mundial. Além dos impactos financeiros se mostrarem insignificantes com esta fusão, os impactos do ponto de vista social, simbólico e também financeiro para as mulheres serão devastadores, temos a certeza que esta medida resultará em um efeito dominó em todos os ministérios, secundarizando, invisibilizando e, até mesmo, exterminando o pouco que temos de políticas para as mulheres, bem como reforçará o processo nos municípios e estados. É inadmissível que as Margaridas coloquem 70 mil mulheres na rua na luta por democracia, políticas públicas e transformações no Estado e tenhamos como resposta o retrocesso e a aplicação da agenda da direita.

Por fim, nos colocamos, como sempre, à disposição para o diálogo na busca por alternativas reais frente à difícil conjuntura que enfrentamos, com a certeza de que muitos outros desafios estão postos, e que juntas podemos encontrar respostas efetivas. Caso contrário, retrocederemos, perdendo legados que duramente conquistamos nos últimos anos.

Em nome de todas as Margaridas do campo, da cidade, das águas e das florestas, nos despedimos desejando muita força e sabedoria frente aos desafios a serem enfrentados e esperando por respostas concretas que respeitem toda a luta das mulheres!

Coordenação da Marcha das Margaridas

AMB – Articulação de Mulheres Brasileiras

CNS – Conselho Nacional das Populações Extrativistas

CONTAG- Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura

CUT – Central Única dos Trabalhadores

CTB – Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil

GT Mulheres da ANA – Articulação Nacional de Agroecologia

MAMA – Movimento Articulado de Mulheres da Amazônia

MIQCB – Movimento Interestadual de Quebradeiras de Coco Babaçu

MMM – Marcha Mundial das Mulheres

MMTR-NE – Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Nordeste

UBM – União Brasileira de Mulheres

UNICAFES – União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária

Para compartilhar: http://www.marchamundialdasmulheres.org.br/margaridas-em-marcha-contra-o-fim-da-spm-carta-a-presidenta-dilma-rousseff/

domingo, 27 de setembro de 2015

Aborto, saúde, sexualidade, raça, educação e política: mulheres debatem estratégias de luta em Ação na Fronteira

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Após um primeiro dia de debates e intercâmbios entre mulheres do Brasil, Argentina e Uruguai sobre legalização e despenalização do aborto e estratégias de enfrentamento à violência, a quarta ação internacional da MMM seguiu com atividades de formação e intercâmbio, em Santana do Livramento (RS), na fronteira com Rivera/Uruguai.
Neste dia 27 de setembro, segundo dia da Primavera pelo Direito ao Corpo e a Vida das Mulheres, as 500 mulheres participantes se dividiram em oficinas temáticas para aprofundar o intercâmbio de práticas de resistências e alternativas em defesa da autonomia sobre nossos corpos. Todas as metodologias, temáticas e dinâmicas das oficinas foi construída coletivamente pelas militantes da Marcha Mundial das Mulheres do Rio Grande do Sul, envolvendo a participação das mulheres do Paraná, Santa Catarina, Argentina e Uruguai.
Enfrentar a mercantilização e a medicalização dos corpos, resgatar os saberes populares para promover a saúde das mulheres
As mulheres retomaram a crítica à mercantilização do corpos, que se expressa na palavra de ordem: “Somos mulheres e não mercadorias!”. A combinação do mercado com o machismo e o racismo segue impondo padrões de beleza e comportamento, lucrando com a criação de novas necessidades. As mulheres são constantemente julgadas e consideradas inadequadas, e ao mesmo tempo são oferecidas pílulas, dietas, hormônios e produtos para regular os nossos corpos, mas também os nossos comportamentos. A indústria farmacêutica e o poder médio interferem na saúde das mulheres, impondo a medicalização excessiva e oferecendo muitas opções de medicamentos que aliviam os sintomas sentidos, mas sem se preocupar com entender quais as causas das dores e ansiedades, ou seja, sem se preocupar com a promoção da saúde. A indústria da beleza também está diretamente ligada a estes processos, pois impõe padrões que chegam à multiplicação de intervenções cirúrgicas para que os corpos se adequem ao padrão estabelecido.
Tudo isso afasta as mulheres do conhecimento sobre seu próprio corpo, assim como de métodos não medicamentosos para cuidar da saúde, da contracepção e de ciclos hormonais naturais como a menstruação e a menopausa. As participantes trocaram conhecimentos sobre seus corpos e sua saúde e também receitas alternativas à indústria farmacêutica.  Também consideraram necessária a maior inserção das mulheres nos movimentos de saúde para reivindicar uma nova lógica e abertura para outros saberes.
Por autonomia sobre os nossos corpos 
A legalização e despenalização do aborto é uma pauta central nesta Ação. As participantes construíram espaços para a discussão de estratégias para avançar na luta pela autonomia, e também espaços de acolhimento e troca de experiências sobre a clandestinidade, que atinge números altíssimos de mulheres em países onde o aborto é crime.
As mulheres do Uruguai, pais que despenalizou parcialmente o aborto em 2012, relataram sobre a necessidade de mais avanços na legislação para que nenhuma mulher seja penalizada por abortar, e diferenciaram as realidades entre interior e capital no pais. As brasileiras e argentinas trouxeram suas realidades distintas enquanto países que possuem, em comum, a criminalização do aborto e, por conseguinte, de mulheres.
Na clandestinidade, a solidariedade das mulheres salva vidas. A experiência das Socorristas en Red, da Argentina, inspirou a todas as participantes, que refletiram sobre a necessidade de disputar o sentido da palabra e da experiência do aborto. Apontaram a necessidade de divulgar os relatos sobre aborto como relatos de vida e de autonomia, ainda que na clandestinidade. No Brasil, uma ferramenta que apoia essa estratégia é o blog Somos Todas Clandestinas.
A formação sobre a realidade do aborto é uma estratégia fundamental entre as mulheres, para enfrentar os dogmas e mitos em torno desta prática. “Es una tortura para la mujer practicarse un aborto y vivir esto con culpa. Las mujeres vamos a seguir abortando. Nuestra lucha es para no seguir muriendo. Vamos a morir menos si estamos organizadas”.
Os debates pautaram a necessidade de trabalhar com o tema do aborto não apenas como uma questão de saúde publica, mas também de autonomia. Conversaram sobre as raízes sistêmicas da maternidade compulsória e do papel reprodutivo que, às mulheres, é atribuído desde a infância. As mulheres afirmaram que, diante da ofensiva conservadora e machista, é necessário dar visibilidade à luta pela legalização do aborto, descriminalizar também social e culturalmente o conceito do aborto, pautar o assunto em cada vez mais espaços e com os mais diversos segmentos da sociedade. Relembraram o dia 28 de setembro, Dia Latinoamericano e Caribenho pela Descriminalização e Legalização do Aborto, como um dia de lutas a ser convocado e fortalecido todos os anos, até que todas sejamos livres, a partir da atuação em rede, da auto organização e da solidariedade.
Políticas públicas para mulheres
Nas oficinas foi debatida a importância das politicas públicas para as mulheres, para a promoção de autonomia, o enfrentamento à violência, à feminização da pobreza e às desigualdades sociais e de gênero, com especial destaque para a necessidade de mais politicas estatais de geração de renda.
Também consideraram a necessidade de políticas com orçamentos específicos para mulheres em uma perspectiva coletiva não apenas brasileira, mas que englobe os vários países da América do Sul. As participantes se posicionaram veementemente contra o fim da Secretaria de Políticas para Mulheres (SPM) e consideram esta possibilidade um retrocesso na luta pela igualdade.
Por uma sexualidade livre!
A discussão sobre lesbianidade, bissexualidade e da identidade de gênero, trouxe a questão da autonomia dos corpos das mulheres como central, por entender que nossas sexualidades são discriminadas e violentadas a partir da manutenção da heterossexualidade compulsória como forma de controlar nossos corpos e desejos.
O fundamentalismo e o conservadorismo, presentes em peso na nossa política atual, são ameaças à laicidade do Estado. Foi pontuado o rechaço das militantes da Marcha Mundial das Mulheres ao Estatuto da Família e aos projetos reacionários da bancada moralista.
Enfrentamento ao racismo e luta das mulheres negras
As mulheres presentes transformaram a oficina em um espaço de fortalecimento coletivo das mulheres negras, pautando a necessidade de seu protagonismo nas lutas feministas e antirracistas. Houve uma oficina de turbantes como cultura de resistência e, a partir desta dinâmica, elaboraram questionamentos importantes sobre as mulheres negras dentro do feminismo
O tema do trabalho doméstico e de cuidados marcou este debate, pois as mulheres negras são a maioria neste trabalho tão desvalorizado. Sobre isso, lançaram à roda o seguinte questionamento: “se são as mulheres negras que fazem a maior parte dos cuidados, quem cuida das mulheres negras?”
As mulheres reiteraram o importante papel das políticas afirmativas contra o racismo e a discriminação para fortalecer suas ações e empoderá-las coletivamente. Estas políticas são urgentes e precisam ser efetivas, garantindo mais espaço para as mulheres negras na sociedade em todos os setores que a compõe. Também por isso, as mulheres se colocaram completamente contra o fim da Secretaria de Políticas de Promoção de Igualdade Racial.
As participantes reforçaram seu compromisso com a presença na Marcha das Mulheres Negras, que acontecerá em novembro, em Brasília, apontando para a articulação que continuará após a oficina nos estados do Sul e entre as organizações presentes.
Educação para combater o conservadorismo
Muitas mulheres educadoras estiveram presentes neste debate. Elas vieram de diferentes espaços de atuação e regiões do Sul do país, e se propuseram a somar na construção de uma perspectiva feminista nas escolas a partir de formulações já iniciadas pelo conjunto da Marcha Mundial das Mulheres. As participantes debateram a resistência dos setores conservadores à inclusão de políticas de educação não-sexista nos Planos Nacional e Municipais de Educação (PNE e PMEs), rechaçaram o uso do termo “ideologia de gênero”, difundido por estes setores de forma negativa, e retomaram o compromisso de construir uma educação não-sexista mesmo sem o respaldo dos planos.
As mulheres denunciaram os efeitos nefastos da atual política de ajuste e a precarização da educação pública, que não colocam a educação como prioridade real. No âmbito das universidades, também discutiram os casos de violência e abuso, mais escancarados recentemente, e afirmaram que são urgentes e necessárias políticas de combate à violência nos ambientes universitários. Dentre estas políticas, elencaram o treinamento especializado, a criação de centros para atendimento e acolhimento dentro dos campi e a inclusão da discussão sobre gênero nos currículos escolares como um todo.
O debate não acabou aqui
Todos os grupos de oficinas finalizaram suas falas reiterando a necessidade de criar e fortalecer mais espaços de formação feminista, especialmente em espaços onde o feminismo atualmente possui menos acesso. Assim, assumiram o compromisso de multiplicar todas as resistências, práticas e formulações feministas deste encontro regional em ações locais de ampliação do debate. Paralelo a isso, também lembraram a necessidade de firmar ainda mais nossas alianças e parcerias com movimentos sociais mistos que, assim como nos, lutam por um mundo mais igual e livre.
Todas estas discussões foram levadas para a plenária final, que encaminhou a elaboração de um documento final desta Ação Internacional da Marcha Mundial das Mulheres.
As participantes realizaram em seguida uma ocupação feminista do Parque Internacional, com as músicas da batucada feminista que denunciavam o machismo e a política conservadora no estado do Rio Grande do Sul, assim como afirmavam o feminismo, o combate ao racismo e a autonomia das mulheres sobre seus corpos e sexualidade. As mulheres negras realizaram uma oficina de turbante no parque, dando visibilidade a luta anti-racista e feminista.
Na ocupação feminista do Parque, houve o lançamento do livro “Código Rosa”, de Dahiana Belfiori, que apresenta 17 relatos ficcionais de experiências de aborto acompanhadas pelas Socorristas en Red. As socorristas são difusoras de informações sobre o uso seguro do Misoprostol, encontram as mulheres cara a cara em praça pública, em um ação política, solidária e cotidiana de construção de autonomia.