quarta-feira, 1 de abril de 2020

A violência contra a mulher em tempos de isolamento social e COVID-19*






Não há dúvidas que até o momento a melhor estratégia de combate ao COVID-19 (Coronavírus) é a quarentena, para quem tem a opção. Isolar-se em casa é uma medida de segurança para as cidadãs e cidadãos, ou deveria ser. Aqui precisamos fazer um recorte e lembrar que para muitas mulheres em nosso país e com destaque para o RS, seus próprios lares não são lugares seguros.

Vivemos em um país que passa por crescentes casos de violência contra as mulheres e feminicídios, somado a um governo conservador e fundamentalista de extrema-direita, misógino, armamentista, que propaga discursos de ódio contra as minorias e promove retirada de direitos. É difícil saber onde estamos seguras. Somado a isso, a chegada do Coronavírus ao Brasil em meados de março e a determinação dos governos de que as pessoas devem permanecer em isolamento social para evitar a transmissão trouxe à superfície, novamente, outra epidemia que o Brasil vive: a violência doméstica.

O Brasil corre o risco de ver seus índices de violência contra a mulher, que já são elevados, alavancar. O isolamento social devido ao Coronavírus obriga as mulheres a compartilharem o local de isolamento com seus agressores 24 horas por dia ou perto disso e por tempo indeterminado, tendo em vista que quase metade dos casos de violência contra mulher é praticado por parceiros e ex-parceiros. No estado do Rio de Janeiro já foi registrado um aumento de 50% nos casos de violência doméstica durante o período de isolamento social. Autoridades de São Paulo acompanham com preocupação que o mesmo ocorra no estado. Outros países que passam pela pandemia também registraram aumento da violência doméstica, é o caso da China.

Após o fechamento da Secretaria Estadual de Políticas para as Mulheres, durante o governo Sartori, houve uma redução drástica no aporte orçamentário que chegava a R$10.073.313,89 em governos anteriores. O governo Eduardo Leite destinou R$20.000,00 para políticas de enfrentamento a violência contra as mulheres. Em 2019, o RS foi o terceiro estado que mais matou mulheres, foram 100 casos de feminicídio. Até a segunda quinzena de fevereiro de 2020 foram registrados 12 feminicídios no estado, um aumento de 233%, conforme os dados do Relatório Preliminar da Força Tarefa Interinstitucional de Combate ao Feminicídio. 

Esses dados são do período anterior ao decreto de quarentena, o que nos leva a crer que esses números serão elevados, o que representa mais mulheres vítimas de violência. São vidas que podem ser exterminadas a qualquer momento, já que estão confinadas no mesmo ambiente que seus agressores. O risco é de aumento de uma curva tão preocupante quanto a do Coronavírus.

A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves recentemente fez um pronunciamento pedindo às pessoas que denunciem casos de violência e abuso. A relatora especial da ONU sobre Violência contra Mulher, Dubravka Simonovic recomendou que os estados devem adotar medidas urgentes para esse tipo de violência. Contudo, nenhuma delas toca no cerne da questão. A violência contra as mulheres é um mecanismo de poder e de controle. É resultado de um sistema de dominação masculino e capitalista, pois as mulheres são exploradas no mercado de trabalho concentradas em empregos menos valorizados, com menos direitos e sobrecarregadas com a naturalização da divisão sexual do trabalho, que coloca as tarefas de cuidado com a casa, com os filhos e os idosos como responsabilidade exclusiva das mulheres, sem remuneração. Embora o trabalho doméstico e o cuidado sejam fundamentais para a reprodução social dos trabalhadores, quando se trata de remunerar essa atividade, o sistema capitalista se relaciona com a cultura colonialista e escravocrata brasileira ao inferiorizar a atividade e desvalorizar sua remuneração, desempenhada em sua maior parte por mulheres negras. Enquanto vivermos em uma sociedade organizada pela exploração capitalista, pelo machismo que mata as mulheres e pelo racismo que estrutura a profunda desigualdade e a exploração no Brasil, toda crise será motivo para que ocorram aumentos nos casos de violência e de mortes das mulheres, principalmente nas comunidades periféricas das cidades, do campo e das florestas. Somente uma sociedade pautada em valores coletivos como justiça social, saúde pública e gratuita, educação pública gratuita e de qualidade a todas e todos, distribuição de renda, direitos ao trabalhador e a trabalhadora e remuneração adequada, soberania alimentar e dos territórios e povos, poderá promover ambientes mais seguros às mulheres. 

                  Por isso gritamos “RESISTIMOS PARA VIVER, MARCHAMOS
                                                                     PARA TRANSFORMAR!”.


No Rio Grande do Sul, a Força Tarefa Interinstitucional de Combate ao Feminicídio informa que agora é possível registrar ocorrência envolvendo violência doméstica através da delegacia online (www.delegaciaonline.rs.gov.br e seguir o passo a passo) ou através do Disque 180, Disque 100 e da Brigada Militar 190.

*Escrito por Juliana, militante da Marcha Mundial das Mulheres em Nova Prata – RS.

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